segunda-feira, 8 de março de 2010

Intervenção do presidente do Governo Regional


Texto integral da intervenção do presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César, proferida hoje, na cerimónia de inauguração da Casa de Abrigo do Faial no Dia Internacional da Mulher:

“Inaugurámos, hoje, nesta cidade da Horta, mais uma Casa Abrigo para mulheres e filhos menores vítimas de violência: evocamos, assim, oficialmente, de uma forma efectiva e com um conteúdo reforçado, o Dia Internacional da Mulher, também assinalado, em outras ilhas, através de diferentes iniciativas desenvolvidas pelo Governo dos Açores e, em colaboração, por instituições particulares de solidariedade social.

Desde 1975, ano em que a ONU instituiu o dia 8 de Março como Dia Internacional da Mulher, esta é uma data em que milhões de pessoas, como nós, convocam as suas memórias e as suas energias, exaltando as conquistas sociais, políticas e económicas das mulheres e, simultaneamente, preceituando novas formas para atenuar ou suprimir persistentes injustiças e imposições preconceituosas que oprimem mulheres um pouco por todo o mundo.

É inquestionável que a igualdade de direitos entre os homens e as mulheres ganhou um novo alcance institucionalista com a sua consagração, em 1945, na Carta das Nações Unidas. É também certo, porém, que, mesmo definida como alvo específico do Desenvolvimento do Milénio, em 2000, ela continua a ser, no século XXI, em boa parte, uma aspiração e não uma realidade, inclusive entre os Estados de Direito.

Em países e regiões como Portugal e os Açores, apesar dos progressos alcançados nos dois níveis da sua ordem jurídica, o dia a dia revela-nos, com frequência e grosseria, condicionamentos e sofrimentos que abalam a condição da mulher. É o caso, por exemplo, da violência doméstica, que atinge ainda muitas mulheres e que constitui uma mancha na nossa sociedade. Esta situação exige, pela sua insistência, uma vigilância a favor da dignidade e da cidadania, que é da responsabilidade de todos e que, felizmente, tem sido intensificada com crescentes resultados.

A Democracia, que vivemos há pouco mais de três décadas, trouxe às mulheres portuguesas maior capacidade de afirmação, de realização pessoal e maior dignidade. Registou-se uma evolução considerável do seu estatuto no plano legislativo, no acesso a níveis de escolaridade elevados, na sua afirmação profissional e no ingresso em carreiras até então exclusivamente reservadas aos homens, bem como na ascensão a lugares de chefia e influência importantes.
Nos Açores, esse processo de inclusão, embora partindo de uma posição tradicional de maior inibição, tem sido muito impressivo em vários planos e, em particular, nestes últimos vinte anos.

O movimento de entrada vigorosa das mulheres no mundo do trabalho, que está a acontecer nas nossas ilhas e que irá, certamente, continuar, é, provavelmente, o movimento social mais marcante da última década nos Açores. O aumento do número de mulheres a trabalhar nos últimos dez anos foi de 41%, passando de cerca de 32 mil e duzentas para perto de 45 mil. O número de mulheres jovens (entre os 25 e os 34 anos) a trabalhar aumentou 34%, passando de pouco mais de dez mil para 13.774.

Poder-se-ia, em primeira análise, pensar que este movimento não é mais do que uma progressão, processada à imagem do que já aconteceu no continente norte-americano ou na Europa, em particular nos países nórdicos, onde a taxa de emprego de mulheres é das mais altas do mundo. Mas, a verdade é que ele representa não só uma manifestação de emancipação social como também uma alteração muito relevante nas dinâmicas e oportunidades resultantes do crescimento, diversificação e qualificação da economia açoriana.

Acresce, na caracterização desta tendência, a velocidade com que está a ocorrer, o que, mesmo assim, não tem gerado grandes perturbações na qualidade desse processo. Os dados dos Quadros de Pessoal preenchidos pelas empresas entre 2000 e 2008, publicados pelo Observatório do Emprego e Formação Profissional, evidenciam bem essa consistência: nos últimos nove anos, enquanto que o número global de trabalhadores nos Açores aumentou 15%, o número de mulheres nos quadros das empresas aumentou 52%, o de mulheres “quadros superiores” 121%, e, mais relevante ainda, o número de mulheres “quadros altamente qualificados” aumentou 300%.

São valores muitíssimo significativos, que ilustram a intensidade da transformação positiva em curso. Na sua origem está, sem dúvida, o crescimento que a economia açoriana experimentou nos últimos anos, acima das médias nacional e europeia, mas também a eficácia das políticas de qualificação educativa e profissional e dirigidas ao emprego feminino. A evidenciá-lo estão alguns exemplos: nos programas de qualificação com vista a uma maior empregabilidade no sector do turismo já foram destinatárias mais de duas mil mulheres; em cada três jovens que saem do ensino profissional com o nível III, 12º ano, duas são mulheres; 85% dos formados no programa Reactivar são, igualmente, mulheres. Lembro, a propósito, outro programa, elogiado recentemente por especialistas externos como único e inovador no espaço europeu, o “Programa Berço de Emprego”, que está a ter um papel fundamental no combate ao bloqueio à contratação de mulheres, estabelecendo uma via instrumental muito eficaz para a protecção da maternidade e a conciliação da vida familiar com o trabalho.

Durante décadas, desde que existem estatísticas de emprego na Região, o número de mulheres desempregadas situava-se sempre entre 60 e 70% do total dos desempregados. Actualmente, essa dimensão já foi reduzida para os 47%, o que corrobora esta mudança fortíssima que se verificou na estrutura do mercado de trabalho e que muito tem favorecido a autonomização económica das mulheres e o seu acesso e desempenho entre as profissões.

Também a implementação de uma extensa e diversificada rede de equipamentos de apoio social a idosos, crianças e jovens, mulheres vítimas e pessoas com deficiência ajudou, de forma directa ou reflexa, a disponibilidade das mulheres para outras tarefas para além das de cuidadora do meio familiar.

Contudo, todos temos a consciência de que é necessário fazer mais no sentido de encontrar novos equilíbrios, designadamente no acesso aos cargos de responsabilidade na vida pública e à conciliação da esfera profissional e familiar. Não sendo algo que dependa exclusiva ou predominantemente da acção dos governos, o Governo dos Açores tomou a opção de estruturar o seu empenhamento através da implementação do Plano Regional da Igualdade de Oportunidades, o qual, assim se espera, deverá contribuir para uma promoção mais densificada da igualdade de género e da maior probidade dessa relação em comunidade.

Assumimos, do mesmo modo, como prioridade, aquilo que julgamos ser a obrigação de um governo, com as nossas competências, em casos como o da violência doméstica. Embora a primeira “Casa Abrigo” para mulheres vítimas de violência só tenha sido aberta nos Açores em 1997, resultando de uma parceria entre o Governo Regional e o Centro de Apoio à Mulher de Ponta Delgada, decorridos doze anos a Região possui uma Rede Regional de oito Casas Abrigo entre as apenas trinta e cinco Casas Abrigo existentes em todo o país; dos catorze centros de atendimento e acompanhamento para vítimas de violência, quatro foram implementados nos Açores; e foram criados quatro centros comunitários para a inserção e promoção sócio-profissional para vítimas de violência. Nos últimos dez anos, o financiamento dos serviços e intervenções referenciados nesta problemática aumentou onze vezes e a execução do Plano Regional de Prevenção e Combate à Violência Doméstica, também já elaborado, vai implicar um investimento financeiro ainda mais acrescido.

Foi nessa sequência que, com o objectivo de promover respostas céleres e uma gestão eficiente, racionalizar recursos e articular o trabalho das organizações envolvidas, que criámos as redes de suporte à mulher em situação de risco de S. Miguel e da Terceira, e, em Dezembro último, a do Faial. Foi igualmente com apoio técnico e financeiro do Governo que, em 2008, foi concebido, no âmbito do trabalho da rede de S. Miguel, o “Programa Psico-educacional para Agressores Conjugais – Contigo”. Este programa, que já está a ser implementado na Comarca de Ponta Delgada com resultados positivos – para os quais muito tem contribuído a atitude empenhada e imprescindível da Polícia de Segurança Pública, do Ministério Público e da Delegação nos Açores da Direcção-Geral de Reinserção Social – vai ser alargado às restantes ilhas ainda este ano.

Tudo isto tem sido feito com muita convicção politica, mas todos estes avanços estão ancorados numa muito interessada colaboração, não só entre entidades públicas, como com organizações do movimento associativo e do voluntariado. Sem esses contributos estaríamos, certamente, mais atrás.


Inaugurámos hoje a “Casa de Abrigo” do Faial, promovida em parceria com a UMAR – Açores. É mais um passo positivo e mais um equipamento ao serviço de uma politica de recuperação social e de inclusão.
Os Açores serão mais desenvolvidos, mais justos e mais solidários se as mulheres e os homens desfrutarem de oportunidades iguais, de opções e de capacidades que lhes permitam viver em liberdade e dignidade. Por isso, exorto todos os açorianos e todas as açorianas, todos os sectores do Governo e da sociedade civil, a intensificarem esforços e compromissos com esse fim.

Queremos, todos, de uma ponta à outra das nossas ilhas, que nos orgulhemos uns dos outros. Que nos respeitemos, que nos amemos: homens e mulheres, mulheres e homens.”


GaCS/CT

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