quarta-feira, 9 de abril de 2014

Intervenção do Secretário Regional da Educação, Ciência e Cultura

Texto integral da intervenção do Secretário Regional da Educação, Ciência e Cultura, Luiz Fagundes Duarte, proferida hoje na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta:

“O regime de empréstimo de manuais escolares nas unidades orgânicas do Sistema Educativo da Região Autónoma dos Açores rege-se pelo disposto em dois decretos legislativos regionais:

O primeiro é o Decreto Legislativo Regional n.º 18/2007/A, de 19 de julho, na parte respeitante à Ação Social Escolar – uma vez que o restante já foi revogado e substituído pelo atual diploma do Estatuto do Aluno.

A parte deste Decreto relativa à Ação Social Escolar, onde se incluem os manuais escolares, encontra-se em vigor porque nunca foi revogado – e constituirá o corpo do já anunciado novo Decreto Legislativo Regional, cuja proposta está a ser ultimada pelo Governo e será em breve posta à discussão pública e apresentada a esta Assembleia.

Temos também o Decreto Legislativo Regional n.º 26/2012/A, de 19 de junho, que trata exclusivamente do empréstimo de manuais escolares.

Para um tratamento sistémico desta matéria, dever-se-á ainda ter em conta os Decretos Legislativos Regionais relativos ao Plano e Orçamento da Região Autónoma dos Açores para os anos de 2013 e 2014, nos quais a ação que anteriormente existia para os manuais escolares foi eliminada, transitando as respetivas provisões para a ação referente à Ação Social Escolar.

Ou seja, o Governo propôs, a Assembleia aprovou, que o empréstimo de manuais, com o respetivo fundo bibliográfico, deve ser assumido pela (e como tal integrar a) Ação Social Escolar. É nesse sentido que o Governo está a ultimar, como já referi, uma proposta de Decreto Legislativo Regional exclusivamente dedicado à Ação Social Escolar, incluindo o sistema de empréstimo de manuais escolares.

No primeiro dos referidos decretos – que, recorde-se, nunca foi revogado no que diz respeito à Ação Social Escolar, onde se inclui a comparticipação na aquisição dos manuais escolares –, determina-se que estes são comparticipados em função do escalão de rendimentos em que se inserem os alunos e definem-se os valores percentuais relativos a cada escalão da Ação Social Escolar.

Neste diploma, determina-se ainda (n.º 7 e 8 do art.º 113.º) que “os livros, equipamentos informáticos e materiais duradouros que forem integralmente comparticipados são propriedade da unidade orgânica, podendo esta exigir a sua devolução após o termo da utilização” – o que configura, embora não o diga expressamente, o mecanismo de empréstimo que viria, pelo segundo destes decretos, a ser definido e regulamentado, bem como a constituição de um fundo bibliográfico para utilização, nos anos subsequentes, pelos “alunos mais carenciados”.

Por sua vez, e como já foi referido, o segundo decreto vem instituir, de um modo mais formal, o fundo bibliográfico subjacente ao mecanismo do empréstimo de manuais escolares. E neste diploma se considera que todos os alunos do Sistema Educativo Regional podem ser beneficiários do regime de empréstimo – incluindo, note-se, os beneficiários do regime de Ação Social Escolar.

Este regime de empréstimo de manuais escolares é considerado, no preâmbulo do diploma, como “um sistema complementar de apoio ao já previsto na Ação Social Escolar”, no sentido de reforçar os princípios da equidade e da promoção da igualdade de oportunidades dos alunos no acesso aos meios de informação, aos manuais escolares e a outros recursos didático-pedagógicos.

Ao definir os critérios de aplicação do regime de empréstimo de manuais escolares, o decreto determina que (a) incumbe às unidades orgânicas “planear e assegurar a execução e gestão do fundo bibliográfico”, (b) os encarregados de educação têm que prestar uma caução correspondente a 20% do preço de compra do manual escolar, que será restituída no final da utilização, depois de verificada a sua devolução em condições de reutilização, e (c) os alunos beneficiários de auxílio económico relativo aos manuais escolares, no âmbito da Ação Social Escolar, estão isentos da prestação da caução.

Temos aqui uma porta aberta para a comparação entre os dois diplomas, ambos em vigor, que são, em certa medida, incompatíveis entre si sobre a mesma matéria.

O Decreto Legislativo Regional n.º 18/2007 considera que o valor máximo da comparticipação do fundo escolar na aquisição de manuais varia entre 15% para os escalões I e II e 5% para os escalões III e IV, no 1.º Ciclo do ensino básico, enquanto para os alunos do 2.º e do 3.º Ciclo do básico e os do secundário tais comparticipações sobem para 40% no escalão I, 35% no escalão II, 30% no escalão III e 20% no escalão IV – admitindo ainda uma comparticipação integral, situação em que o aluno fica obrigado à devolução dos manuais, ou seja, entra num regime de empréstimo.

Por seu lado, o segundo decreto introduz a caução de 20% sobre o preço de capa do manual – esquecendo que, sendo os manuais reutilizados, o seu preço de compra já não deveria ser usado como referência para os manuais anteriormente utilizados por outros alunos, porquanto já estarão desvalorizados do ponto de vista comercial.

E ainda determina que os alunos beneficiários da Ação Social Escolar estão isentos da prestação de caução – o que os coloca, automaticamente, ao abrigo do diploma da Ação Social Escolar que, de facto, não prevê caução mas sim uma comparticipação do fundo escolar de:

Escalões              1.º ciclo                2.º e 3.º ciclos e secundário
I                                15%                                      40%
II                               15%                                      35%
III                                5%                                      30%
IV                                5%                                      20%
V                                 0%                                        0%

ou

Todos                                  100% → devolução


Ou seja, se o aluno escalonado pela Ação Social Escolar se candidatar ao abrigo do diploma em vigor da Ação Social Escolar pode ter manuais gratuitos, com devolução, ou então uma comparticipação que vai de 5% a 40% do preço de capa.

Mas, se se candidatar ao abrigo do decreto mais recente, o mesmo aluno tem direito ou ao empréstimo gratuito (ou seja, sem caução), previsto em ambos os diplomas, ou a uma comparticipação para a compra.

Por sua vez, os alunos não escalonados pela Ação Social Escolar (os do escalão V), que não são naturalmente considerados no primeiro decreto, passam a sê-lo, indiretamente, ao abrigo do segundo: com efeito, ao prestarem uma caução de apenas 20% do preço de compra do manual – se não o devolverem, é como se o tivessem adquirido pelo preço de 20% do valor de capa, sendo os restantes 80% suportados pela Ação Social Escolar.

Ou seja, o decreto dos empréstimos de manuais escolares permite, na prática, que os alunos não escalonados pela Ação Social Escolar tenham uma comparticipação de 80% na aquisição dos manuais – o que, como é fácil de entender, constitui uma injustiça face àqueles que mais necessitam.

Dou um exemplo: em 2013, houve 161 alunos não beneficiários da Ação Social Escolar (escalão V) que aderiram ao regime de empréstimo de manuais. Se, findo o presente ano letivo, estes alunos não devolverem os manuais, a caução de 20% não lhes será devolvida – o que significa que os restantes 80% corresponderão a encargos para a Ação Social Escolar.

Ou seja, o regime de empréstimo criado por este decreto permite que os alunos não beneficiários da Ação Social Escolar possam sê-lo no que diz respeito aos manuais escolares.

É por isso que o novo diploma da Ação Social Escolar que em breve será apresentado a esta Assembleia integrará, criticamente, os conteúdos dos dois decretos, introduzindo as alterações necessárias para garantir aos alunos uma real igualdade de oportunidades, prevendo os apoios para aqueles que de facto deles necessitam e evitando que, graças à utilização de fragilidades detetadas nos dois diplomas em vigor, os alunos que não necessitam de apoios deles venham, na prática, a usufruir.

Por isso, a aplicação à letra do disposto no decreto dos empréstimos dos manuais escolares não impede que as escolas, no âmbito das suas competências, apliquem também o Decreto da Ação Social Escolar no que diz respeito aos manuais escolares – o que implica o efeito das fragilidades em ambos detetadas.

De qualquer modo, a Inspeção Regional de Educação está no terreno a verificar a prática das nossas unidades orgânicas nesta matéria – o que, naturalmente, prejudica o ponto 2 do projeto de resolução aqui em discussão.

No que diz respeito ao ponto 1 do projeto da Representação Parlamentar do Bloco de Esquerda, o Governo vai muito mais longe: verifica a aplicação do primeiro decreto e, muito em breve, trará a esta casa uma proposta de Decreto Legislativo Regional que corrigirá e harmonizará aquilo que, neste momento, é matéria de dois Decretos Legislativos Regionais que, no que aos manuais diz respeito, brigam entre si, sem que o mais recente deles tenha revogado o mais antigo, dando assim origem à situação que hoje temos e que, em certos casos, retira àqueles que mais precisam – para dar àqueles que não precisam”.




GaCS

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