sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Intervenção do Vice-Presidente do Governo Regional

Texto integral da intervenção do Vice-Presidente do Governo Regional, Sérgio Ávila, proferida hoje, em Ponta Delgada, na conferência A Nova Lei Das Finanças Locais:

“Quero agradecer, em nome do Governo dos Açores e do Presidente do Governo, que, por impossibilidade de agenda não pode, ao contrário do que era sua vontade, estar hoje aqui presente, o convite da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas para participar nesta conferência de grande oportunidade temática.

De facto, o tema da conferência, que pretende refletir sobre a nova lei das finanças locais, tem toda a pertinência.

 O Governo dos Açores, procurando permanentemente aperfeiçoar os mecanismos da nossa autonomia como alicerce de desenvolvimento dos Açores e do bem-estar dos açorianos, entende que o poder local é um parceiro estratégico, um aliado e, por isso mesmo, a nova Lei de Finanças Locais constitui uma matéria de relevante interesse e importância para os Açores. 

Contudo, esta lei, à semelhança de outras medidas de politica legislativa nacional que têm vindo a ser tomadas ultimamente, e que a crise não justifica, mais não é do que a restrição da autonomia das autarquias e de redução dos seus recursos e, consequentemente, da sua capacidade de intervenção de que destaco, naturalmente, as autarquias da Região Autónoma dos Açores.

Incorpora um conceito centralista de decisão, de restrição da capacidade das autarquias potenciarem os seus recursos, incidindo excessivamente sobre a imposição de mecanismos e decisões de gestão que devem ser competência exclusiva dos órgãos autárquicos legitimamente eleitos pelo povo.

A consolidação das contas públicas do país não se faz restringindo a capacidade de gestão e decisão dos órgãos autárquicos, mas dando-lhes mais autonomia e capacidade gestionária e, essencialmente, distinguindo-as em função dos resultados que obtêm.

O princípio da igualdade nunca pode ser assegurado obrigando todos a serem medíocres, nem que uns paguem pelos erros dos outros, mas permitindo e incentivando a que cada parte beneficie dos resultados que obtém e do trabalho que realiza.

Autonomia será sinónimo de igualdade e solidariedade nacional quando assentar nos resultados obtidos e no contributo real para a concretização dos objetivos e compromissos nacionais e não quando previamente restringida e amputada da sua capacidade de decidir como gerir os recursos para cumprir os objetivos e compromissos a que solidariamente está vinculada com o país.

Como já foi afirmado, esta lei, injusta na perspetiva da distribuição dos recursos financeiros de forma equilibrada entre as administrações central e local, diminui também a receita orçamental das autarquias, o que é ainda mais significativo e aumenta as dificuldades de acesso ao financiamento por parte das autarquias da Região, em razão da sua dimensão territorial e demográfica.

Incorpora, por isso, uma desvalorização do objetivo de desenvolvimento harmonioso, equilibrado e coeso do país.

Obviamente, seria mais barato para o Estado que todos os portugueses passassem a viver apenas em Lisboa e no Porto, mas trata-se de um conceito perigoso, pois alguém poderá depois, e de acordo com o mesmo princípio, lembrar que seria também mais barato que todos os europeus vivessem na Alemanha.

Por isso, os municípios representam um instrumento insubstituível na coesão territorial nacional e asseguram a manutenção desse desígnio nacional.

A despesa efetiva que os municípios executam para a concretização desse objetivo não é, pois, um encargo nem um custo para o Estado, mas um investimento essencial na concretização de uma das funções fundamentais do Estado.

E é também a essência do princípio constitucional da solidariedade nacional.

Acresce dizer-se que a incorporação de uma transferência ilegítima de responsabilidade, e consequentemente de encargos, do Estado para as autarquias, na nova Lei de Finanças Locais, com a criação do novo Fundo de Apoio Municipal financiado pelas câmaras municipais, é potencialmente violadora da Constituição e feita ao arrepio dos mais elementares princípios de igualdade, coesão e solidariedade.

Esta lei alterou as formas de cálculo dos fundos até então existentes, o que implica mais uma redução das transferências para os municípios e freguesias.

No caso dos municípios açorianos, as transferências do Orçamento de Estado previstas para 2014 serão inferiores em 12,5 milhões de euros ao valor transferido em 2010, o que representa uma redução de 12,5%, e essa redução implica curiosamente que neste ano de 2014 irão receber sensivelmente o mesmo que o transferido em 2004, o que, na prática significa efetivamente uma década de retrocesso.

Mas a situação é ainda mais difícil para as freguesias, que sofreram nos últimos quatro anos uma redução de mais de 14% nas transferências do Orçamento de Estado, apesar do investimento nas Juntas de Freguesia do país ter uma expressão insignificante no total do Orçamento de Estado.

Se juntarmos a esta redução efetiva das transferências dos fundos do OE para as autarquias o facto de a receita arrecadada com o IMT deixar de ser receita dos municípios, isso equivale, nos Açores, a uma perda de receita de cerca de seis milhões de euros, o que acaba por resultar num prejuízo indireto para os açorianos.

Com o acréscimo da restrição no acesso ao crédito por parte das autarquias municipais, cumpre-se um propósito desproporcionado, numa altura em que todos os indicadores disponíveis apontam para uma situação de controlo do endividamento dos municípios, pelo menos desde 2007.

Esta medida ainda se mostra mais inaceitável numa altura em que, adicionalmente, se eliminam algumas exceções que existiam quando se tratava de empréstimos para fins específicos e relevantes, como o de garantir a comparticipação em projetos comunitários candidatados pelos municípios, o que implicará uma redução significativa da capacidade das autarquias aproveitarem os financiamentos comunitários no próximo período de programação 2014-2020.

Como já afirmei, o caminho do Governo Regional em prol do desenvolvimento e do bem-estar dos nossos concidadãos alicerça-se no entendimento de que o poder local é, na Região Autónoma dos Açores, um parceiro estratégico.

Assim, fazemos da cooperação técnica e financeira com os municípios e as freguesias um instrumento de concretização de projetos locais de interesse regional.

Como evidência de uma cooperação profícua entre o Governo Regional e as autarquias foram celebrados contratos ARAAL, desde 1997 até hoje, que permitiram transferências de verbas num valor que ascendeu a mais de 120 milhões de euros, para investimento em áreas tão diversificadas como a habitação, a educação, o desporto, o ambiente, a rede viária, a segurança social, o abastecimento de água ou a construção de novas sedes de Juntas de Freguesia.

Para melhor percebermos este esforço, tomando por base um mesmo tempo relativo, quase que triplicámos, em 15 anos, o volume financeiro do apoio cooperativo às autarquias açorianas, o que só pode significar uma aposta inequívoca nesta parceria estratégica.

Para além desta realidade, temos privilegiado também a cooperação técnica e financeira direta com as nossas freguesias, para além do apoio técnico assiduamente prestado pela administração regional nas questões de natureza jurídica e contabilística inerentes à gestão diária das autarquias, proporcionando, ao mesmo tempo, um apoio financeiro que ascendeu a cerca de 11 de milhões de euros na última década.

No caso da construção de novas sedes a comparticipação do Governo é já superior a 2,7 milhões de euros, sem incluir o apoio financeiro a pequenas reparações nas sedes de Junta de Freguesia e à aquisição de mobiliário, equipamento e software informático, num valor que ultrapassa os quatro milhões de euros.

Por toda a região, de Santa Maria às Flores, as nossas Juntas de Freguesia têm sido significativamente apoiadas, num esforço que permite que órgãos de tão grande proximidade às populações possam prosseguir a sua meritória ação de apoio às comunidades onde se enquadram.

É esse esforço que queremos continuar a fazer, contribuindo, também dessa forma, para assegurar um cada vez melhor serviço aos açorianos e a consequente promoção da qualidade de vida nos Açores.

Termino, fazendo votos para que esta iniciativa meritória da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas corresponda aos seus melhores propósitos de esclarecimento e debate”.



GaCS

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