sexta-feira, 21 de novembro de 2014

Intervenção do Secretário Regional da Agricultura e Ambiente

Texto integral da intervenção do Secretário Regional da Agricultura e Ambiente, Luís Neto Viveiros, proferida hoje, na Horta, na sessão de abertura da reunião do Bureau Internacional da Assembleia das Regiões Europeias Vitícolas – AREV:

“É com o maior gosto que intervenho, em representação do Senhor Presidente do Governo dos Açores, na sessão de abertura da reunião do Bureau Internacional da AREV - Assembleia das Regiões Europeias Vitícolas.

Permitam-me pois manifestar o reconhecimento do Governo pela realização nos Açores desta reunião que reputamos da maior importância, por três razões:

- Pelo prestígio da AREV;

- Pela sua representatividade no panorama vitivinícola europeu;

- e também pela sua oportunidade, quando se encontram em negociação dossiers decisivos para o futuro das vinhas e dos vinhos europeus.

Desejo também, por isso, que a vossa visita permita conhecer melhor a realidade vitivinícola do arquipélago, em cujo desenvolvimento e afirmação estamos fortemente empenhados.

Embora os Açores sejam uma região com largas tradições vitivinícolas, ao longo dos tempos e por fatores diversos, a cultura da vinha e a produção de vinho têm sofrido grandes contrariedades.

No séc. XVII, a área de vinha ocupava nesta Região cerca de 16.000 hectares, o que correspondia, então, a 10,5% da superfície agrícola útil dos Açores.

No final do séc. XX, esta área situava-se nos 3.000 hectares, equivalentes apenas a 2,5 % da Superfície Agrícola Utilizada.

Esta diminuição tem origem conhecida em fatores como a substituição de castas nobres (castas europeias de Vitis vinífera) por híbridos de produtores diretos, devido ao aparecimento da filoxera e do oídio, doenças que também motivaram o abandono gradual das terras dedicadas à produção de uva.

A necessidade de relançar esta cultura e de, simultaneamente, defender as populações rurais ligadas à atividade vitivinícola, motivou a adoção das seguintes medidas:

- a criação de três Zonas Demarcadas (Pico, Biscoitos e Graciosa);

- a criação da Comissão Vitivinícola Regional dos Açores;

- a implementação de programas de ajudas ao investimento, como é o caso do VITIS;

- e a criação de medidas de ajudas ao rendimento, através de programas como o POSEI e os Pagamentos Agroambientais.

Das ajudas ao investimento, têm resultado aumentos da área reestruturada, o que já permitiu, numa primeira fase, relançar a cultura nas ilhas com maior tradição - Terceira, Graciosa e Pico.

Registamos com muito agrado a existência nestas ilhas de viticultores e adegas cooperativas a produzirem vinhos de qualidade, vinhos que têm vindo a conquistar prémios e a merecer a escolha de restaurantes europeus de referência.

A classificação, há 10 anos, pela UNESCO, da Paisagem da Cultura da Vinha do Pico como Património Mundial potenciou também a recuperação desta área, tendo a Região acrescentado aos incentivos já existentes um regime de apoio para esta área protegida a que os viticultores aderiram com entusiasmo.

Em 2004, a área de vinha em produção na zona classificada era de apenas cerca de 130 hectares perspetivando-se que, nos próximos três/quatro anos, a área de vinha em produção ultrapasse os 350 hectares.

O investimento do Governo dos Açores na reabilitação e manutenção da vinha do Pico duplicou nos últimos anos. Cresceu de 549 mil euros em 2012 para 1,1 milhões de euros este ano, representando um esforço significativo, mas consequente.

De todo este investimento, público e privado, tem resultado um aumento da quantidade e da qualidade dos vinhos produzidos.

Enfrentamos, contudo, desafios e dificuldades inerentes à nossa realidade arquipelágica.

Um dos principais problemas estruturais do setor, na nossa Região, é a pequena dimensão das parcelas e a sua dispersão, associadas a um sistema de condução tradicional denominado "curraletas ou currais", onde a vinha é conduzida no chão, entre muros de pedra, como terão oportunidade de visitar já amanhã.

Estas caraterísticas exigem elevada mão-de-obra, não permitindo a mecanização de algumas técnicas culturais.

É, portanto, a qualidade, a diferenciação e a identidade dos nossos vinhos e do seu modo de produção único que devem constituir-se como uma mais-valia comercial, por forma a ultrapassar os custos de produção inerentes e a limitação de quantidades de vinho produzido.

Como referi, foram consagradas três zonas aptas a produzirem Vinhos de Qualidade.

Decorrente da aprovação das Regiões Demarcadas, surgiu a Comissão Vitivinícola Regional dos Açores (CVRAçores), com sede na ilha do Pico.

Reconhecida a tipicidade própria para a produção de vinhos de qualidade e considerando o progresso enológico verificado nos últimos anos, alargou-se a regulamentação existente e, neste momento, existem, além da Denominação de Origem “Biscoitos”, “Pico” e “Graciosa”, a Indicação Geográfica “Açores”.

Vamos, assim, continuar a apostar estrategicamente neste setor, estabelecendo como prioritária a reestruturação de uma vasta área ainda por recuperar, nomeadamente nas ilhas de Santa Maria e S. Miguel.

Bem como nas ilhas Terceira, Graciosa e Pico, que estão em condições de continuar o processo de reestruturação.

Conforme mencionei, os principais fatores que condicionam a produção vitícola nos Açores, estão relacionados com a pequena dimensão e a dispersão das parcelas de vinha, a dificuldade de acesso às mesmas e o sistema artesanal da cultura.

Por outro lado, temos condições climatéricas caracterizadas por poucas horas de sol descoberto, chuva e humidade relativa do ar bastante elevadas.

O que, geralmente, origina problemas fitossanitários ao longo do ciclo vegetativo, os quais, ao ocorrerem durante a fase de maturação, podem provocar consequências graves, nomeadamente quebras da produção.

Produzir vinho nos Açores é, por isso, também um ato de dedicação, de vontade e do exercício de uma arte herdados dos nossos antepassados, que da pedra souberam fazer uma aliada na produção de vinha junto ao mar.

Imbuídos do mesmo espírito, vamos prosseguir a aposta na dinamização e fortalecimento da vinha, do vinho e da sua cultura.

Numa estratégia que assenta nos seguintes objetivos:

1. recuperar, conservar e valorizar o património genético das principais castas existentes nos Açores (Verdelho, Arinto dos Açores e Terrantez do Pico);

2. consolidar a produção de vinhos com Denominação de Origem e Indicação Geográfica;

3. fortalecer e garantir o apoio técnico à cultura da vinha e à produção do vinho;

4. reforçar, cada vez mais, a reestruturação da vinha nas ilhas onde ela já se iniciou e desenvolver a sensibilização dos viticultores das restantes ilhas;

5. melhorar a formação de técnicos e viticultores, nomeadamente ao nível de ações apropriadas de experimentação e de divulgação;

6. consolidar a qualidade do produto, através da constante melhoria das estruturas de transformação vitivinícolas;

7. promover e apoiar as estruturas associativas vitivinícolas existentes;

8. e, por fim, mas não menos importante, promover o Enoturismo na Região.

Estes são objetivos que sabemos serem prosseguidos pela AREV.

Desde logo, a promoção do Enoturismo, que tem sido objeto de estudo por parte desta organização.

Um deles, aliás, foi acompanhado a par e passo pela Região que, enquanto região vitícola, nele colaborou.

Refiro-me à vizinha ilha do Pico e a toda a problemática associada à Rota dos Vinhos.

Assim como acompanhamos, com o maior interesse, um outro estudo sobre a criação de uma marca de excelência enoturística, a ser utilizada por todas as regiões membros da AREV, como é o caso dos Açores.

O objetivo é criar uma marca não comercial que identifique e promova o produto, por exemplo “Vinhas da Europa”, permitindo assim uma diferenciação relativamente a outros territórios internacionais.

Enquanto membros da AREV, que intervém junto de todas as instituições e instâncias encarregues, direta ou indiretamente, da política vitivinícola europeia ou mundial, e em todos os dossiers que se relacionem com o vinho, subscrevemos a posição contra a tentativa de liberalização dos direitos de plantação.

A AREV compara – e, na nossa opinião, bem - esta liberalização à deslocalização de empresas, originando perda de postos de trabalho.

O Governo dos Açores defende a proteção intransigente dos vinhos e vinhedos europeus, os seus 'terroirs' e, simultaneamente, as paisagens características e os empregos.

Aliás, na reunião em Remich, em maio último, foi reiterada a posição da não-aceitação da proposta da União Europeia de permitir que anualmente seja autorizado 1% de área de vinha para novas plantações.

Só na campanha de 2011/2012 foram arrancados 165.000 hectares, com o apoio financeiro da União Europeia.

Ora, entendemos que não faz sentido a Comissão, por um lado, estar a pagar o arranque e, por outro, permitir a plantação de novas áreas.

Identificamo-nos, também, com a posição de defesa assumida pela AREV relativamente à Denominação de Origem, no sentido de proteger os vinhos que simbolizam as respetivas regiões de produção, como fator de identidade e valorização dos produtos.

Reforçamos a nossa posição de que a rotulagem dos vinhos não pode desvirtuar as informações a que o consumidor está habituado e, portanto, é de toda a importância que os vinhos continuem a usar as menções habituais, sob pena de – imperando algumas propostas - estarmos a vender vinhos sem rosto e sem identidade.

Relativamente às negociações para acordos de comércio livre UE-EUA, são as normas europeias (associadas às da Organização Internacional da Vinha e do Vinho) que devem ser acauteladas nas negociações para o setor vitivinícola.

Pretendemos, ainda, garantir o respeito pelas práticas enológicas reconhecidas pela Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV) para o conjunto dos vinhos exportados para o mercado europeu e a isenção do certificado de aprovação do rótulo (COLA) para os vinhos europeus.

Este será um dos assuntos a ser tratado hoje, aqui, na reunião dos Açores, cujas conclusões serão divulgadas amanhã em conferência de Imprensa, na ilha do Pico.

Conscientes de que a transferência para o poder europeu de funções e competências em matéria de agricultura, do meio ambiente, do comércio internacional e da fiscalidade justificam que seja mantida a voz das Regiões no diálogo com a Europa, consideramos a presença e a participação ativas dos Açores em organizações como a AREV da maior relevância.

Permitindo um trabalho prévio de concertação dos pontos de vista e uma maior força na defesa dos interesses comuns.

Que serão hoje, com certeza, encontrados ao longo do dia.

Termino, reiterando as boas vindas a todos os participantes e desejando que esta seja uma reunião profícua.

Obrigado!”



GaCS

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