quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Intervenção do Presidente do Governo na Sessão de Abertura da XVI Conferência dos Presidentes das RUP



Texto integral da intervenção do Presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César, proferida hoje, na Sessão de Abertura da XVI Conferência dos Presidentes das Regiões Ultraperifèricas:

As minhas saudações a todos, nesta Sessão de Abertura da XVI Conferência dos Presidentes das Regiões Ultraperiféricas, realçando e agradecendo a hospitalidade e o apoio que, uma vez mais, nos são dispensados pelo Governo e pela Região das Canárias, particularmente pelo Presidente Paulino Rivero Baute.

Aproveito, aliás, estas considerações iniciais para salientar a determinação e a eficiência que as Canárias revelaram na liderança desta nossa organização, quer nas suas componentes internas quer na sua representação junto das outras entidades e instâncias comunitárias.

Recordo também outro presidente e amigo – Adán Martín Menis – falecido há tão pouco tempo, cujo empenhamento e generosidade foram certamente reconhecidos por todos que, como eu, o conheceram e admiraram.

Esta XVI Conferência coincide com outra alteração que tem, para todos nós, um significado especial: a assinatura, que ocorrerá proximamente, da integração da Região Saint-Martin na nosa organização, passando a integrar as nossas esperanças e preocupações. Esperamos ver Saint-Martin a trabalhar connosco muito brevemente.

A integração de Saint Martin – tal como a de outras regiões com outras localizações e países – representa, como há muito defendo, um factor de acréscimo da nossa capacidade política e do peso da diferenciação que reclamamos e do tratamento que exigimos no seio da União Europeia. Este alargamento é, pois, desejado e saudado pelos Açores, desde que efectuado com coerência e sem qualquer perda na caracterização já assente dos nossos circunstancialismos e especificidades.

Como sabemos – e pudemos verificar através do relatório de actividades há pouco apresentado – o ano que passou, desde a nossa última Conferência, foi marcado por um intenso e laborioso trabalho na defesa e promoção das Regiões Ultraperiféricas.

Na verdade, devemos entender como referências importantes para as nossas regiões alguns acontecimentos e implicações últimos, tais como:

- primeiro, a assinatura, há precisamente um ano, do memorando conjunto “As RUP no Horizonte 2020”, documento esse que procurámos associar a uma estratégia europeia renovada e ao início de uma nova fase de afirmação e defesa das nossas Regiões, designadamente em consonância com a mudança de paradigma da Comunicação da Comissão “As RUP: Um Trunfo para a Europa” e com os desafios do período de discussões para o pós-2013.

- a segunda circunstância relevante foi a 7 de Maio de 2010, com a obtenção do apoio e da adesão formal dos estados português, francês e espanhol a “Uma visão renovada da estratégia europeia para a ultraperiferia”, através do memorando comum, com o mesmo título;

- em terceiro lugar, destaco as matérias de interesse que estiveram em debate no Primeiro Fórum da Ultraperiferia; e, não menos importante,

- todos os envolvimentos e participações de cada região e em conjunto em processos de consulta pública sobre matérias tão importantes como os transportes, a política comum de pescas, a energia, a estratégia Europa 2020 e, ainda, o espaço atlântico da política marítima integrada.

Justifica-se, pois, que consideremos normal mas urgente uma resposta política e formal da Comissão Europeia. Esta instituição deve definir uma visão clara acerca da renovação da Parceria da UE com as RUP, que tenha em conta os desenvolvimentos posteriores à Comunicação de 2008 e os contributos entretanto trazidos pelas Regiões e pelos seus Estados-Membros. Uma definição favorável às nossas pretensões é muito importante e decisivamente influenciadora no quadro das futuras negociações, designadamente da política regional, para consolidarmos tendências e instrumentos adaptados à realidade específica e exclusiva das Regiões Ultraperiféricas.

Como todos sabemos, o contexto actual não é, evidentemente, o mais favorável para a adopção de políticas financeiras expansionistas, e se, mesmo noutros contextos, para além do Presidente da Comissão Europeia e alguns poucos outros Comissários, não são muitos os decisores que aderem à consideração positiva das ultraperiferias e até à importância da Política Regional em geral, bem nos podemos consciencializar que as nossas tarefas, em defesa própria, são difíceis.

Como temos visto, apesar dos nossos esforços e contributos, bem como do apelo do Conselho Europeu de Junho deste ano, não sabemos se e quando haverá uma nova comunicação da Comissão sobre as Regiões Ultraperiféricas. A Unidade RUP, por sua vez, que tem feito um trabalho empenhado e eficaz, como aconteceu, por exemplo no Fórum da Ultraperiferia, tem ainda muito trabalho para desenvolver, sobretudo no aprofundamento do papel fundamental que esta Unidade tem revelado na pedagogia e articulação das matérias da ultraperiferia junto de outras Direcções Gerais e serviços da Comissão.

Não tenhamos dúvidas: mesmo no seio da Comissão Europeia existem desconhecimento e, até, resistências em relação ao regime e realidade das Regiões Ultraperiféricas. Um caso paradigmático é o dos serviços jurídicos da Comissão, que, ao arrepio do disposto no Tratado de Lisboa, recusam reiteradamente a utilização do artigo 349º como base jurídica para medidas específicas várias para as RUP. Sobre isso, aliás, compete-nos ter uma posição mais firme e exigir idêntica firmeza dos nossos Estados.

A nível dos Estados em geral, a crise económica e financeira e as consequentes pressões internas representam, claramente, um desafio à solidariedade europeia, nomeadamente no que diz respeito ao financiamento da futura política de coesão. Precisamos, de novo e nesse contexto, de uma Comissão forte e de Comissários Europeus que, independentemente das dificuldades, tenham capacidade de liderança e de assumir a função essencial de serem o “motor da construção europeia”.

Mas, os momentos de crise representam, também, oportunidades de afirmação, tanto ao nível europeu como regional, no encontro de políticas inovadoras que respondam aos desafios e adaptadas às diferentes realidades territoriais. As Regiões da Europa – e as RUP em particular – têm aqui uma oportunidade para dar um exemplo, na sua capacidade de reacção e de aproveitamento dos instrumentos disponíveis, reforçando a importância de uma governação de proximidade e do princípio da coesão territorial.

No período decisivo em que nos encontramos, é, assim, fundamental a união de esforços das Regiões Ultraperiféricas, dos nossos Estados-Membros e a articulação próxima com a Comissão e o Parlamento Europeu, não só para defesa daqueles interesses que nos são comuns, mas também, num esforço de solidariedade, de concertação e de apoio mútuo às pretensões mais particulares de cada região.

A Região Autónoma dos Açores renova, aqui, o seu compromisso com o teor do memorando “As RUP no Horizonte 2020”.

Defendemos o desenvolvimento de um quadro estratégico transversal e coerente, no qual as potencialidades das RUP se assumam, definitivamente, como factores de crescimento e em que o apoio específico a sectores como a inovação, a investigação e o conhecimento seja implementado sem esquecer as medidas de compensação que permitam apoiar os sectores – também estratégicos – tradicionais e primários, bem como a indústria, os serviços e os transportes.

Assumimos, desde há vários anos, nos Açores, o compromisso com um modelo de desenvolvimento sustentável, assente na potenciação da economia produtiva e exportadora, na biodiversidade natural, na economia do mar e da agricultura substitutiva de importações, no desenvolvimento do turismo associado à natureza, não descurando igualmente o investimento na educação e formação de activos, na ciência e na investigação, na utilização de tecnologias espaciais e inovadoras, ou em importantes programas de reforço das fontes renováveis de energia.

Mas não nos esquecemos – e, pelo contrário, sentimos diariamente como obstáculos – os nossos condicionalismos geoeconómicos, evidenciados muito concretamente no Tratado de Lisboa: afastamento, insularidade, pequena superfície, dispersão geográfica. Por isso, o mais importante agora, de mãos dadas com todos os que podem estar ao nosso lado – e o Parlamento Europeu tem dado boas notas nesse sentido – o que é preciso é lutar com muita determinação por uma política regional forte e dotada dos meios financeiros adequados.

E, nesses âmbitos, é essencial não nos esquecermos da importância fundamental de políticas sectoriais, como a marítima, a agrícola e a das pescas.

Neste contexto, reitero a posição de que a União Europeia deve corrigir a sua abordagem relativamente às pescas, reintroduzindo, entre outras medidas, a área de protecção de 200 milhas do mar dos Açores e reconhecendo os benefícios globais de uma gestão de proximidade, descentralizada e ambientalmente responsável. Não o fazendo, revela uma desatenção condenável em relação aos bons princípios da conservação e sustentabilidade dos recursos naturais marinhos e de cedência a interesses de partes que conflituam com o interesse geral em presença. Continuamos a esperar um melhor entendimento por parte dos órgãos de decisão da União Europeia e não desistimos de a alertar para isso nem de convocar a solidariedade activa das regiões ultraperiféricas tal como de outras.

Numa abordagem mais geral dos assuntos do mar, parece-nos de importância central que num futuro financiamento da política marítima integrada prevaleça, por um lado, uma alocação de meios que tenha em conta a dimensão das várias áreas marítimas regionais da Europa e, por outro, a imensa responsabilidade e os serviços prestados à União que, nelas, as regiões assumem.

A União Europeia deve, ainda, não apenas proclamar a qualidade e relevância dos sectores primários e tradicionais das RUP, mas reforçar efectivamente a promoção da competitividade, avaliar previamente o impacto das suas políticas e garantir a protecção dos rendimentos dos produtores – objectivo primordial da PAC –, muito em especial na perspectiva do desmantelamento do regime das quotas leiteiras.

Concluindo, queria expressar a minha convicção de que a nossa Europa pode ser mais próspera, mais competitiva e mais coesa.

Mas quero deixar a minha opinião de que isso só será possível através do reforço efectivo da governação europeia e não no ascendente de um só país na governação dos outros, na regulação que a todos deve vincular de um plano de recuperação progressiva das economias que não destrua o projecto social europeu e não na passividade perante a instabilidade social de países da nossa casa comum, na coesão da diversidade e não na divisão entre os que têm mais e menos possibilidades presentes e futuras, na confirmação do papel determinante da política regional e, entre outros aspectos, no nosso caso, na afirmação das políticas para as ultraperiferias conforme o Tratado de Lisboa. Se não trilharmos caminhos de integração europeia dessa forma estruturante, a Europa – as nossas regiões – terão mais prejuízos do que benefícios aos níveis progressivamente mais globalizados em que nos projectamos e em que nos inserimos.

Infelizmente, por razões que se prendem com o acompanhamento de assuntos nacionais que são determinantes para a minha Região, tenho de regressar, ainda hoje, ao início da tarde, aos Açores. Os Açores, todavia, ficarão aqui bem representados através da tutela dos assuntos europeus e da cooperação externa do seu governo.

Não gostaria, no entanto, de partir sem deixar de vos transmitir que temos muito empenhamento nesta organização e que a entendemos com uma importância crescente no quadro da reestruturação institucional do conjunto da União Europeia. Tenho também a certeza de que as nossas regiões não auferirão nenhum benefício importante nem manterão nenhum dos aspectos mais positivos de que desfrutam sem o nosso empenhamento conjunto, nesta Conferência e através dela. Desejo, por isso, o maior sucesso à Martinica na Presidência da nossa Conferência, sob a orientação do Presidente Serge Letchimy, durante o próximo ano, e faço votos também para o maior esforço por parte de todos no mesmo sentido.

Obrigado pela vossa atenção.”


GaCS/CT

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