
Texto integral da intervenção do Presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César, proferida hoje, na Sessão de Abertura da XVI Conferência dos Presidentes das Regiões Ultraperifèricas:
As minhas saudações a todos, nesta Sessão de Abertura da XVI Conferência dos Presidentes das Regiões Ultraperiféricas, realçando e agradecendo a hospitalidade e o apoio que, uma vez mais, nos são dispensados pelo Governo e pela Região das Canárias, particularmente pelo Presidente Paulino Rivero Baute.
Aproveito, aliás, estas considerações iniciais para salientar a determinação e a eficiência que as Canárias revelaram na liderança desta nossa organização, quer nas suas componentes internas quer na sua representação junto das outras entidades e instâncias comunitárias.
Recordo também outro presidente e amigo – Adán Martín Menis – falecido há tão pouco tempo, cujo empenhamento e generosidade foram certamente reconhecidos por todos que, como eu, o conheceram e admiraram.
Esta XVI Conferência coincide com outra alteração que tem, para todos nós, um significado especial: a assinatura, que ocorrerá proximamente, da integração da Região Saint-Martin na nosa organização, passando a integrar as nossas esperanças e preocupações. Esperamos ver Saint-Martin a trabalhar connosco muito brevemente.
A integração de Saint Martin – tal como a de outras regiões com outras localizações e países – representa, como há muito defendo, um factor de acréscimo da nossa capacidade política e do peso da diferenciação que reclamamos e do tratamento que exigimos no seio da União Europeia. Este alargamento é, pois, desejado e saudado pelos Açores, desde que efectuado com coerência e sem qualquer perda na caracterização já assente dos nossos circunstancialismos e especificidades.
Como sabemos – e pudemos verificar através do relatório de actividades há pouco apresentado – o ano que passou, desde a nossa última Conferência, foi marcado por um intenso e laborioso trabalho na defesa e promoção das Regiões Ultraperiféricas.
Na verdade, devemos entender como referências importantes para as nossas regiões alguns acontecimentos e implicações últimos, tais como:
- primeiro, a assinatura, há precisamente um ano, do memorando conjunto “As RUP no Horizonte 2020”, documento esse que procurámos associar a uma estratégia europeia renovada e ao início de uma nova fase de afirmação e defesa das nossas Regiões, designadamente em consonância com a mudança de paradigma da Comunicação da Comissão “As RUP: Um Trunfo para a Europa” e com os desafios do período de discussões para o pós-2013.
- a segunda circunstância relevante foi a 7 de Maio de 2010, com a obtenção do apoio e da adesão formal dos estados português, francês e espanhol a “Uma visão renovada da estratégia europeia para a ultraperiferia”, através do memorando comum, com o mesmo título;
- em terceiro lugar, destaco as matérias de interesse que estiveram em debate no Primeiro Fórum da Ultraperiferia; e, não menos importante,
- todos os envolvimentos e participações de cada região e em conjunto em processos de consulta pública sobre matérias tão importantes como os transportes, a política comum de pescas, a energia, a estratégia Europa 2020 e, ainda, o espaço atlântico da política marítima integrada.
Justifica-se, pois, que consideremos normal mas urgente uma resposta política e formal da Comissão Europeia. Esta instituição deve definir uma visão clara acerca da renovação da Parceria da UE com as RUP, que tenha em conta os desenvolvimentos posteriores à Comunicação de 2008 e os contributos entretanto trazidos pelas Regiões e pelos seus Estados-Membros. Uma definição favorável às nossas pretensões é muito importante e decisivamente influenciadora no quadro das futuras negociações, designadamente da política regional, para consolidarmos tendências e instrumentos adaptados à realidade específica e exclusiva das Regiões Ultraperiféricas.
Como todos sabemos, o contexto actual não é, evidentemente, o mais favorável para a adopção de políticas financeiras expansionistas, e se, mesmo noutros contextos, para além do Presidente da Comissão Europeia e alguns poucos outros Comissários, não são muitos os decisores que aderem à consideração positiva das ultraperiferias e até à importância da Política Regional em geral, bem nos podemos consciencializar que as nossas tarefas, em defesa própria, são difíceis.
Como temos visto, apesar dos nossos esforços e contributos, bem como do apelo do Conselho Europeu de Junho deste ano, não sabemos se e quando haverá uma nova comunicação da Comissão sobre as Regiões Ultraperiféricas. A Unidade RUP, por sua vez, que tem feito um trabalho empenhado e eficaz, como aconteceu, por exemplo no Fórum da Ultraperiferia, tem ainda muito trabalho para desenvolver, sobretudo no aprofundamento do papel fundamental que esta Unidade tem revelado na pedagogia e articulação das matérias da ultraperiferia junto de outras Direcções Gerais e serviços da Comissão.
Não tenhamos dúvidas: mesmo no seio da Comissão Europeia existem desconhecimento e, até, resistências em relação ao regime e realidade das Regiões Ultraperiféricas. Um caso paradigmático é o dos serviços jurídicos da Comissão, que, ao arrepio do disposto no Tratado de Lisboa, recusam reiteradamente a utilização do artigo 349º como base jurídica para medidas específicas várias para as RUP. Sobre isso, aliás, compete-nos ter uma posição mais firme e exigir idêntica firmeza dos nossos Estados.
A nível dos Estados em geral, a crise económica e financeira e as consequentes pressões internas representam, claramente, um desafio à solidariedade europeia, nomeadamente no que diz respeito ao financiamento da futura política de coesão. Precisamos, de novo e nesse contexto, de uma Comissão forte e de Comissários Europeus que, independentemente das dificuldades, tenham capacidade de liderança e de assumir a função essencial de serem o “motor da construção europeia”.
Mas, os momentos de crise representam, também, oportunidades de afirmação, tanto ao nível europeu como regional, no encontro de políticas inovadoras que respondam aos desafios e adaptadas às diferentes realidades territoriais. As Regiões da Europa – e as RUP em particular – têm aqui uma oportunidade para dar um exemplo, na sua capacidade de reacção e de aproveitamento dos instrumentos disponíveis, reforçando a importância de uma governação de proximidade e do princípio da coesão territorial.
No período decisivo em que nos encontramos, é, assim, fundamental a união de esforços das Regiões Ultraperiféricas, dos nossos Estados-Membros e a articulação próxima com a Comissão e o Parlamento Europeu, não só para defesa daqueles interesses que nos são comuns, mas também, num esforço de solidariedade, de concertação e de apoio mútuo às pretensões mais particulares de cada região.
A Região Autónoma dos Açores renova, aqui, o seu compromisso com o teor do memorando “As RUP no Horizonte 2020”.
Defendemos o desenvolvimento de um quadro estratégico transversal e coerente, no qual as potencialidades das RUP se assumam, definitivamente, como factores de crescimento e em que o apoio específico a sectores como a inovação, a investigação e o conhecimento seja implementado sem esquecer as medidas de compensação que permitam apoiar os sectores – também estratégicos – tradicionais e primários, bem como a indústria, os serviços e os transportes.
Assumimos, desde há vários anos, nos Açores, o compromisso com um modelo de desenvolvimento sustentável, assente na potenciação da economia produtiva e exportadora, na biodiversidade natural, na economia do mar e da agricultura substitutiva de importações, no desenvolvimento do turismo associado à natureza, não descurando igualmente o investimento na educação e formação de activos, na ciência e na investigação, na utilização de tecnologias espaciais e inovadoras, ou em importantes programas de reforço das fontes renováveis de energia.
Mas não nos esquecemos – e, pelo contrário, sentimos diariamente como obstáculos – os nossos condicionalismos geoeconómicos, evidenciados muito concretamente no Tratado de Lisboa: afastamento, insularidade, pequena superfície, dispersão geográfica. Por isso, o mais importante agora, de mãos dadas com todos os que podem estar ao nosso lado – e o Parlamento Europeu tem dado boas notas nesse sentido – o que é preciso é lutar com muita determinação por uma política regional forte e dotada dos meios financeiros adequados.
E, nesses âmbitos, é essencial não nos esquecermos da importância fundamental de políticas sectoriais, como a marítima, a agrícola e a das pescas.
Neste contexto, reitero a posição de que a União Europeia deve corrigir a sua abordagem relativamente às pescas, reintroduzindo, entre outras medidas, a área de protecção de 200 milhas do mar dos Açores e reconhecendo os benefícios globais de uma gestão de proximidade, descentralizada e ambientalmente responsável. Não o fazendo, revela uma desatenção condenável em relação aos bons princípios da conservação e sustentabilidade dos recursos naturais marinhos e de cedência a interesses de partes que conflituam com o interesse geral em presença. Continuamos a esperar um melhor entendimento por parte dos órgãos de decisão da União Europeia e não desistimos de a alertar para isso nem de convocar a solidariedade activa das regiões ultraperiféricas tal como de outras.
Numa abordagem mais geral dos assuntos do mar, parece-nos de importância central que num futuro financiamento da política marítima integrada prevaleça, por um lado, uma alocação de meios que tenha em conta a dimensão das várias áreas marítimas regionais da Europa e, por outro, a imensa responsabilidade e os serviços prestados à União que, nelas, as regiões assumem.
A União Europeia deve, ainda, não apenas proclamar a qualidade e relevância dos sectores primários e tradicionais das RUP, mas reforçar efectivamente a promoção da competitividade, avaliar previamente o impacto das suas políticas e garantir a protecção dos rendimentos dos produtores – objectivo primordial da PAC –, muito em especial na perspectiva do desmantelamento do regime das quotas leiteiras.
Concluindo, queria expressar a minha convicção de que a nossa Europa pode ser mais próspera, mais competitiva e mais coesa.
Mas quero deixar a minha opinião de que isso só será possível através do reforço efectivo da governação europeia e não no ascendente de um só país na governação dos outros, na regulação que a todos deve vincular de um plano de recuperação progressiva das economias que não destrua o projecto social europeu e não na passividade perante a instabilidade social de países da nossa casa comum, na coesão da diversidade e não na divisão entre os que têm mais e menos possibilidades presentes e futuras, na confirmação do papel determinante da política regional e, entre outros aspectos, no nosso caso, na afirmação das políticas para as ultraperiferias conforme o Tratado de Lisboa. Se não trilharmos caminhos de integração europeia dessa forma estruturante, a Europa – as nossas regiões – terão mais prejuízos do que benefícios aos níveis progressivamente mais globalizados em que nos projectamos e em que nos inserimos.
Infelizmente, por razões que se prendem com o acompanhamento de assuntos nacionais que são determinantes para a minha Região, tenho de regressar, ainda hoje, ao início da tarde, aos Açores. Os Açores, todavia, ficarão aqui bem representados através da tutela dos assuntos europeus e da cooperação externa do seu governo.
Não gostaria, no entanto, de partir sem deixar de vos transmitir que temos muito empenhamento nesta organização e que a entendemos com uma importância crescente no quadro da reestruturação institucional do conjunto da União Europeia. Tenho também a certeza de que as nossas regiões não auferirão nenhum benefício importante nem manterão nenhum dos aspectos mais positivos de que desfrutam sem o nosso empenhamento conjunto, nesta Conferência e através dela. Desejo, por isso, o maior sucesso à Martinica na Presidência da nossa Conferência, sob a orientação do Presidente Serge Letchimy, durante o próximo ano, e faço votos também para o maior esforço por parte de todos no mesmo sentido.
Obrigado pela vossa atenção.”
GaCS/CT
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