Texto integral da intervenção do Presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César, proferida hoje, na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, na Horta, na sessão parlamentar de apreciação do veto do Representante da República ao decreto que aprovou o Orçamento da RAA para 2011:
“O nosso parlamento é, hoje, chamado a apreciar e decidir, na sequência de um veto político do Representante da República motivado pela sua oposição à norma do Orçamento da Região que aprova a chamada Remuneração Compensatória.
Colocam-se, assim, várias questões: Justifica-se a adopção de medidas que confiram nos Açores um tratamento mais benéfico aos cidadãos e às empresas do que no restante território nacional? Essa diferenciação favorável coloca ou não em causa a solidariedade nacional? É esta medida da remuneração compensatória justa no contexto regional? Tem ou não a Região autonomia bastante para a aprovar? A resposta que damos a essas questões corrobora a adequação dessa e de outras medidas semelhantes tomadas.
São generalizadamente aceites, pela União Europeia e por instâncias nacionais, os considerandos que afiançam a existência de um custo de vida superior nas ilhas face a Portugal continental, e que determinam uma desvantagem permanente que sobrecarrega as pessoas e as empresas. É essa, de resto, a razão que tem levado o Estado a atribuir à maioria dos seus funcionários nos Açores suplementos remuneratórios, que os tornaram mais protegidos do que os funcionários regionais que protegemos agora. Sobre essa diferenciação nunca se levantaram problemas de solidariedade, não só entre eles e as mesmas categorias no Continente, como entre os da administração central e os funcionários regionais, ou acusações de inconstitucionalidade por qualquer outra razão.
Na verdade, também nós temos adoptado medidas de compensação, e que beneficiam sobretudo os mais pobres, no sentido de comporem a sua vida, e os remediados para não caírem na pobreza.
A Remuneração Compensatória não é, pois, uma ideia nova; é mais um apoio justo, atribuído ao escalão mais baixo dos trabalhadores que iriam ver os seus vencimentos reduzidos em 2011, que não os fará receber mais, mas tão só não receber menos. O que acontecerá é que, nos Açores, em vez da redução de salários na função pública ser a partir dos 1500 euros brutos, será a partir dos dois mil. E como a diminuição de salários decretada por Lisboa não atinge os trabalhadores do sector privado esta medida também não se lhes aplica, mas não faltam outras que os beneficiam. E pode a remuneração compensatória ser aplicada à administração local, onde já se pratica a remuneração complementar, caso os municípios o desejem.
Não há, pois, tratamento diferenciado que não se justifique pela existência de realidades diferentes. Injusta seria a redução do IRS proposta pelo PSD que, não se limitando a compensar quem iria perder, beneficiaria quem não foi prejudicado, dando a todos o que todos não perderam. Esta sim, que custaria à Região quatro vezes mais do que a remuneração compensatória, poderia ser uma afronta a todos os portugueses que estão a ver os seus impostos agravados.
Não encontramos qualquer razão que justifique alarde político, e muito menos o conteúdo do veto, a propósito dessa medida que acrescentámos.
Quando criámos a Remuneração Complementar para mais de 6500 funcionários públicos, nunca se duvidou da nossa competência e nunca se considerou uma quebra de solidariedade nacional. E agora que a aumentamos em 2,1%, estamos a não ser solidários? Quando aprovámos um Salário Mínimo Regional mais elevado, que beneficia cerca de sete mil trabalhadores do sector privado, também era eticamente condenável? E o Complemento para Aquisição de Medicamentos, que ajuda 12 mil idosos a comprar medicamentos mais baratos, também é uma falta de solidariedade com o Continente? E o Complemento Açoriano ao Abono de Família para 80 mil Crianças e Jovens, que aumentámos este ano, também é inconstitucional por falha de solidarização? E o Complemento de Pensão – o chamado “cheque pequeno” –, que representa 24 milhões de euros, que aumentámos e abrange cerca de 35 mil pensionistas, que ficam com uma pensão um pouco maior do que a que teriam no Continente, é, como diz o Senhor Representante da República, uma medida de “incompreensível egoísmo”? E se apoiarmos mais, como acontece, os nossos jovens no emprego, estaremos a proceder mal? E o IRS já inferior entre 20 a 30% ao Continente, também, como diz o Representante, é um “desprezo” pelo país?
E quanto às actividades económicas, também, por estarmos em crise, é uma quebra de solidariedade ou do principio de igualdade aumentar os incentivos, manter carga fiscal menor ou ter o gasóleo pescas e agrícola mais barato 24% do que no Continente?
Repito: é então a Remuneração Complementar, o Salário Mínimo Regional, o Complemento de Apoio aos Medicamentos, o Complemento Regional ao Abono de Família, o Complemento de Pensão, tal como também a Remuneração Compensatória, que apoiam milhares e milhares de açorianos, tudo ofensas e quebras de solidariedade nacional? Pelo contrário, são, todas elas, medidas justas de compensação das nossas reconhecidas dificuldades e que respeitam, como sempre foi aceite, os nossos direitos de exercício da nossa autonomia.
São medidas para as quais a Região não pediu nem teve mais dinheiro. Respeitamos o esforço nacional, pelo que também reduzimos as nossas despesas, cumprimos os indicadores exigidos para a consolidação orçamental, e até aceitámos não transferirem, em 2010 e 2011, verbas em dívida para com a Região.
Mas somos uma Região Autónoma: a solidariedade que nos deve ser pedida é a que deve ser prestada pela Região no seu conjunto, e não pelos trabalhadores de um determinado escalão profissional, pela população de uma determinada ilha, ou pelos empresários de uma determinada actividade económica. Somos solidários globalmente com o Estado, como nos obriga o nosso sentido patriótico, mas solidários entre nós nos Açores como nos permite o nosso regime autonómico.
Esta é uma polémica que vale a pena, porque o que não vale a pena é pensarmos que temos uma Autonomia que afinal não nos deixam usar. Não somos nós que pomos em causa a Autonomia tomando as nossas decisões, mas sim os que põem em causa a nossa capacidade de decidir e os que nos Açores se submetem com a espinha curvada dos desistentes. Não somos dos que acham que o melhor serviço a prestar à Autonomia seria não exercê-la: como bem disse um antigo Ministro das Finanças, que ajudou a erguer a Lei de Finanças Regionais, “Quem teme tempestades, acaba a rastejar”.
Nós não prescindimos do nosso direito autonómico de apoiar à nossa maneira os nossos concidadãos e as nossas empresas, sem prejuízo de respondermos positivamente às exigências que se colocam ao nosso país. É assim que somos solidários e é assim que respeitamos a Constituição. Os que querem que as nossas diferenças políticas sejam inconstitucionais são os que não se conformam com a nossa Autonomia na Constituição: são os que gostavam que a nossa Autonomia fosse inconstitucional.
A Remuneração Compensatória não é uma opção do Presidente do Governo, nem simplesmente do Governo ou tão só do partido que apoia o Governo. Trata-se de uma medida aprovada pelo órgão máximo da nossa Autonomia, cuja legitimidade para tal tem o apoio de partidos tão diferentes como o PPM, o PS, o BE, o CDS e o PCP.
Senhoras e senhores deputados do PSD, pensem primeiro na nossa terra e na nossa autonomia e só depois nas vossas tácticas partidárias de ataques ao Presidente do governo. Há um tempo para tudo. Podem continuar as vossas guerras permanentes contra o nosso governo, mas, hoje, a batalha é a favor da nossa Autonomia Regional. Escusam de se servirem de mim para não servirem os Açores.
Aqui devemos estar firmes, com muito orgulho nas nossas instituições e nas nossas gentes. Tomemos, pois, o partido dos Açores.
Muito obrigado.”
GaCS/CT
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