quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Intervenção do Presidente do Governo Regional

Texto integral da intervenção do Presidente do Governo, Vasco Cordeiro, proferida hoje, em Saint-Denis, na Ilha da Reunião, na cerimónia evocativa do 20.º aniversário da Declaração de Saint Malo:

“Permitam-me que comece com uma primeira palavra de saudação particular ao nosso anfitrião, Presidente Didier Robert, por esta iniciativa que assinala e reconhece a história e projeta o futuro da ultraperiferia na Europa.

Há precisamente 20 anos, quando as seis Regiões Ultraperiféricas assinaram a declaração de Saint Malo, vivia-se um tempo novo para o conjunto da então recém-instituída União Europeia.

A Europa saída de Maastricht, unida após um percurso de quatro décadas desde o Tratado de Paris e esperançada no progresso económico e social daí decorrente, lançava-se na aventura da União Económica e Monetária.

Maastricht deu corpo ao sonho de uma unificação política como suporte da integração económica e consagrou, finalmente, a coesão económica e social, concretizada em larga medida pela política regional, mas também pela atenção que mereceu este conjunto de Regiões definidas por uma conjugação única de condicionalismos: as Regiões Ultraperiféricas.

É por isso que o Tratado de 1992 foi um momento de consagração, não apenas do Estatuto, mas também da solidariedade e do princípio da coesão europeias.

No anexo ao Tratado de Maastricht, a definição jurídica do Estatuto da Ultraperiferia traduzia, pois, a nossa condição geográfica e económica materializada na justa ambição de obter uma atuação dedicada e particular da Comissão e do Conselho, tendo como objetivo moldar a legislação europeia a estas características e, assim, promover de forma mais acelerada a aproximação às médias de desenvolvimento do conjunto da União.

A Declaração de Saint Malo afirmou, assim e perante os demais atores regionais e institucionais da União Europeia, a nossa identidade política, enquanto grupo de Regiões com características específicas e, internamente, a nossa união de propósitos e ação, em benefício dos nossos territórios e dos nossos Povos.

Vinte anos volvidos, é de elementar justiça reconhecer o papel daqueles que, tendo a responsabilidade de liderar cada uma das nossas Regiões, ao longo destas duas décadas, souberam alimentar a nossa união, projetar o nosso futuro e entender a relevância dessa ação conjunta.

Fizeram-no, como sabemos, através de uma proclamação solene, mas também pelo efetivo reforço da cooperação inter-regional e procurando uma coordenação eficaz das ações das Regiões Ultraperiféricas, que levaria, pouco depois, à assinatura do protocolo de cooperação e à instituição da nossa Conferência dos Presidentes.

Durante estas duas décadas, e nas diversas batalhas em que nos empenhamos, foi possível às Regiões Ultraperiféricas constituir um património de programas, medidas e decisões das instituições europeias que refletem a diversidade da nossa condição comum e melhor acolhem também o tratamento específico que as características dos nossos territórios exigem da própria União.

As Regiões Ultraperiféricas, atuando de forma conjunta, foram capazes de afirmar politicamente a ultraperiferia, enquanto projeto da própria União Europeia e onde, inclusive, outras Regiões, com determinadas condições geográficas, foram, e ainda hoje podem ir, tentar procurar soluções.

A perceção que os decisores europeus ganharam sobre a necessidade de aplicabilidade das grandes estratégias europeias aos nossos territórios, mas também o potencial que cada uma das nossas Regiões encerra para o conjunto da União, sublinha a pertinência da nossa atuação e reforça a sua necessidade para o futuro.

Exemplo dos resultados deste trabalho contínuo é também a alteração do paradigma da UE em relação às Regiões Ultraperiféricas, passando a olhar de forma mais atenta para as potencialidades de cada um dos nossos territórios, nos mais diversos domínios, reconhecendo que damos um contributo positivo para a União.

Já todos reconhecemos e saudamos que a visão das RUP, enquanto “regiões de oportunidade”, representa um salto qualitativo em relação à visão redutora e ultrapassada das RUP como “regiões-problema”.

Este é, todavia, um processo inacabado e cujos resultados, face à pressão de outros Estados Membros e à que resulta do esquecimento ou incúria das próprias Instituições, nunca podem ser dados por adquiridos.

É, sobretudo, um processo em que demasiadas vezes a União Europeia se deixa arrastar para uma postura demasiado reativa, face às RUP. É tempo de mais próactividade para com a valorização e cumprimento dos objetivos da União Europeia, através das Regiões Ultraperiféricas.

Na verdade, a Europa de Maastricht e de Saint Malo, com 12 Estados-Membros, em duas décadas passou para 28 Estados, do mesmo modo como, paralelamente ao reforço dos poderes do Parlamento Europeu, também os seus membros foram amplamente aumentados em número.

Ou seja, a realidade de uma Europa alargada diluiu o peso relativo das RUP e dos seus representantes, facto que apenas reforça a importância do aprofundamento da nossa cooperação e ação conjunta, bem como a pertinência da pedagogia contínua da ultraperiferia junto dos mais variados interlocutores europeus.

Por outro lado, a nível regional, existem territórios que reclamam, igualmente, uma atenção particular e regimes específicos, desde várias ilhas às regiões de montanha, das zonas pouco povoadas às de fronteira, das rurais às urbanas.

Este é também um desafio claro e determinante para as Regiões Ultraperiféricas: a afirmação do seu Estatuto e realidade no contexto da Europa das Regiões.

Por tudo isso, a vertente pedagógica e reivindicativa da nossa ação deve permanecer como pedra basilar daquilo a que estamos obrigados a fazer, em conjunto e no seio da União Europeia, em defesa dos nossos interesses comuns e para garantir que os resultados obtidos até agora não são, a qualquer momento, subvertidos ou diminuídos.

E como pudemos constatar durante as discussões para o quadro financeiro e regulamentar 2014-2020, nada pode dar-se como adquirido, nem sequer a utilização do nosso fundamento jurídico, tão claramente exposto e consagrado no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

O tempo da história não é, normalmente, o tempo dos homens. Mas há também as felizes ocasiões em que estas duas componentes se conjugam, juntando passado e presente, para projetar o que ainda há-de vir.

Hoje, é este o motivo do nosso encontro e é, também, a justificação para que renovemos o compromisso de, em nome das nossas Regiões e em representação dos nossos Povos, fazermos mais e melhor para projetar o desenvolvimento vindouro e ajudarmos a construir uma União Europeia nos nossos territórios.

Esse é o compromisso que, enquanto Presidente do Governo dos Açores, reafirmo perante os nossos parceiros e amigos aqui presentes, na certeza de que a ultraperiferia possa ser afirmada como fator distintivo e valorizador da União Europeia como um todo e de que a nossa ação política conjunta é a melhor guardiã para a defesa dos interesses dos nossos Povos e territórios.

Muito obrigado”.




GaCS

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