sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Intervenção do Subsecretário Regional da Presidência para as Relações Externas

Texto integral da intervenção do Subsecretário Regional da Presidência para as Relações Externas, Rodrigo Oliveira, proferida hoje, em Ponta Delgada, na apresentação do Estudo Macroeconómico de Impacto para Portugal do Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento UE-EUA, promovido pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento:

"Começo, naturalmente, e em nome do Senhor Presidente do Governo, Vasco Cordeiro, por cumprimentar todos os presentes, saudando, em particular, o Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Dr. Bruno Maçães, o Senhor Secretário Geral da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa, Dr. Pedro Madeira Rodrigues, e o Senhor Administrador da Fundação Luso-Americana, Eng.º Jorge Gabriel, que nos honram com a sua presença e participação na apresentação do Estudo Macroeconómico de Impacto para Portugal do Acordo de Parceria Transatlântica.

O Acordo de Comércio e Investimento entre a União Europeia e os Estados Unidos da América constitui, aliás, uma matéria de inegável importância para a Europa e para Portugal e que, à semelhança de tantas outras, assume, na Região Autónoma dos Açores, uma relevância específica e um enquadramento particular.

Este é, assim, um tema que o Governo dos Açores segue com grande interesse, pelas implicações e oportunidades económicas que representa para a Região, numa ação que se manifesta, desde logo, através de uma articulação próxima com o Ministério dos Negócios Estrangeiros, enquadrada pelo parecer que identifica os interesses específicos que a Região pretende salvaguardar nas prioridades nacionais do quadro global da negociação.

Por outro lado, de modo a aprofundar, desenvolver e consolidar a posição da Região, não apenas em função da evolução das próprias negociações, mas também de documentos entretanto disponibilizados – como é o caso deste estudo - o Governo dos Açores conta, igualmente, com o contributo dos parceiros sociais e, muito em especial, dos produtores e empresários Açorianos, num processo de consulta que se encontra a decorrer.

Ora, como é sabido, os estudos macroeconómicos já realizados sobre a Parceria Transatlântica – quer a nível da União, quer, agora, a nível nacional - concluem por um impacto globalmente positivo para a economia, pese embora com naturais e diferentes expetativas quanto ao grau exato de tais consequências e da sua diferenciação em função dos Estados e, mesmo, das Regiões.

Dito isto, certamente que o estudo em apreço constitui-se como um contributo importante, desde logo para o posicionamento nacional em sede de negociações, mas também para os parceiros sociais e setores económicos melhor se prepararem para os respetivos desafios.

Não me cabendo aqui a função de desenvolver a sua perspetiva nacional, certo é que o estudo conclui, de um modo claro, que a Parceria Transatlântica terá, efetivamente, um impacto positivo e a curto prazo na economia portuguesa.

No que toca à Região Autónoma dos Açores, registamos positivamente as três conclusões do sumário executivo, segundo o qual, num cenário dito “ambicioso” para a conclusão das negociações:

- Em primeiro lugar, verificar-se-á um aumento de 0,35% no PIB;
- Em segundo, "deverá verificar-se”, entre a Região e os Estados Unidos, “um aumento substancial no comércio bilateral de produtos manufaturados, atribuível sobretudo ao aumento das trocas comerciais de produtos alimentares transformados e produtos de base” e,
- Em terceiro, que se estima que “o tráfego portuário aumente igualmente entre 1,0 e 1,8%” nos portos nacionais.

Estes são, assim, dados relevantes e a ter em conta, salvaguardando-se naturalmente – como bem alertam os autores do estudo - as “complexidades e incertezas deste processo” negocial.

Não obstante, ao nível da metodologia adotada para a elaboração do estudo, o Governo dos Açores considera que haveria claras vantagens numa abordagem mais aprofundada e específica sobre a economia da Região e que tivesse em conta dimensões fundamentais como a nossa inserção insular e atlântica central, a mais-valia das nossas infraestruturas (portuárias e aeroportuárias), a nossa vasta diáspora e o consequente relacionamento histórico, político e institucional dos Açores com os Estados Unidos da América.

Tal permitiria uma análise prospetiva e mais detalhada relativamente aos impactos futuros da Parceria Transatlântica na Região e com maior grau de adaptabilidade, particularmente, em relação aos dados setoriais.

Isto porque, na verdade, os setores que têm maior desenvolvimento no estudo – como o têxtil, do vestuário ou maquinaria elétrica – não são efetivamente áreas de atividade com relevância para a Região.

Do mesmo modo, teria sido vantajoso uma maior concretização relativa aos setores primário e agro-industrial, estes sim com a importância na economia e na produção de valor acrescentado nos Açores que todos conhecemos.

Os Estados Unidos da América constituem, efetivamente, um importante mercado de destino da produção dos Açores e que pode, efetivamente, ser reforçado e beneficiado por este processo que levará ao Acordo para a Parceria Transatlântica.

Na verdade, estas exportações são constituídas por um elevado e diversificado número de produtos, sobretudo provenientes do setor agroalimentar e que representaram, em 2011, cerca de 4 milhões e 600 mil euros e, grosso modo, 5% da saída de produtos da Região.

Note-se que o mercado continental português representa, por exemplo ao nível dos produtos lácteos e de acordo com um inquérito de 2012 às empresas produtoras, mais de 80% do destino das respetivas vendas.

Voltando à exportação para os Estados Unidos, estão em causa lacticínios (sobretudo queijo), peixe e conservas de peixe, licores, vinhos, cervejas e refrigerantes, compotas, pimenta moída, pastelaria e, ainda, diversos produtos agrícolas, como inhame, feijão, favas e batata doce.

Ou seja, as vendas para os EUA destinam-se, como é fácil perceber, à satisfação das necessidades de consumo das nossas vastas comunidades açorianas, o denominado “mercado da saudade”.

Mas, apesar desta já relativa relevância, a verdade é que as barreiras existentes atualmente no comércio europeu com os EUA impedem também a Região de concretizar todo o potencial que representa este “mercado da saudade”.

Além disso, estes mesmos fatores dificultam também que os nossos produtos possam alcançar outros nichos num mercado tão diverso e especializado como o norte-americano.

Neste contexto, não temos dúvidas de que a eliminação de entraves à exportação para os Estados Unidos servirá para alavancar este potencial da produção e exportação regional, desde logo pela redução das barreiras não tarifárias (BNT), cujo processo de negociação é complexo, por inúmeros motivos, e cuja ambição para o resultado das negociações é, também por isso, relativamente moderada (ponto que o estudo, e bem, realça).

Aliás, os nossos agentes económicos conhecem bem estes desafios não aduaneiros na exportação para os Estados Unidos, por exemplo ao nível da rotulagem dos produtos, de quotas de importação e dos processos de desalfandegamento, de entrada nos circuitos de distribuição ou, até, de resolução de litígios.

Mas este potencial de exportação será ainda beneficiado, em grande medida e de modo mais direto – conforme nos transmite o estudo -, pela redução ou eliminação dos direitos aduaneiros, que, por exemplo, no caso de exportação de lacticínios, podem chegar aos 139% e, no caso das bebidas, aos 22/23%.

Repare-se que o estudo identifica que a liberalização dos direitos aduaneiros poderá ser “relativamente imediata” e que, no cenário “ambicioso” é considerada mesmo uma redução de 100% desses direitos (e, no “moderado”, de 98%).

Ambos nos parecem cenários claramente otimistas, mas que confirmam que esta questão dos direitos aduaneiros, da sua redução substancial ou eliminação, não será a mais difícil em termos da negociação em curso.

Acompanhamos assim as conclusões do modelo económico, quando refere que “para Portugal os direitos aduaneiros são tão importantes como a redução dos custos das BNT” e que “uma vez que Portugal beneficia proporcionalmente mais das reduções tarifárias do que a UE no seu conjunto, é provável que beneficie mais cedo, e em maior medida, das fases e iniciais da aplicação do TTIP”.

O Governo entende, pois, que existe uma margem de progresso bastante significativa nesta matéria e que a negociação de um acordo que reduza significativamente as barreiras existentes poderá fazer cumprir o potencial de crescimento que o incremento das trocas comerciais, também entre os Açores e os Estados Unidos, poderá representar para o mercado regional, para os seus produtores e para a criação de emprego.

Mas importará igualmente garantir que, qualquer incremento das trocas comerciais entre os Açores e os EUA, não se fará a expensas de uma redução das trocas entre os Açores e outros mercados, já consolidados.

O que pretendemos é, pois, aumentar a nossa capacidade de exportação e alargar o âmbito geográfico dos nossos mercados recetores.

Nesse quadro, é fundamental que o Estado Português e a Instituições Europeias (a Comissão, enquanto negociadora do Acordo, mas também o Parlamento) valorizem e pugnem pelo papel estratégico que os Açores assumem no Atlântico Norte e que poderão reforçar, por via do aumento das trocas comerciais e da prestação de serviços ao abrigo desta Parceria Transatlântica.

Como prioridade, o Governo dos Açores defende, naturalmente e por força da sua estrutura produtiva, uma atenção negocial muito particular de Portugal e da União Europeia para os setores primário e agroalimentar.

Um ponto fundamental é, neste contexto, a defesa da produção regional através da salvaguarda das denominações e indicações regionais protegidas, de modo a garantir o respeito pela autenticidade dos produtos açorianos exportados.

Conhecemos bem os desafios no âmbito da negociação da União Europeia com os Estados Unidos sobre esta matéria em particular - na qual se entrecruzam diferentes perspetivas de política agrícola, ambiental e comercial, entre outras - mas sabemos também que esta é uma preocupação de muitos produtores europeus, a que Portugal e a União não podem condescender.

A aplicação nos Estados Unidos de normas de bem-estar animal e de requisitos ambientais menos exigentes do que na União, a existência de economias de escala muito elevadas na América do Norte ou a utilização de ingredientes na alimentação animal proibidos na Europa são, entre outros, argumentos de grande relevância e que não podem ser desvalorizados em sede negocial.

A este propósito, o Governo dos Açores está ainda particularmente atento a eventuais sinais de abertura, no contexto negocial, a Organismos Geneticamente Modificados, questão sinalizada, desde o início deste processo, como especificamente relevante para a nossa Região.  

No domínio dos transportes aéreos, entende-se por fundamental que os EUA considerem flexibilizar as suas políticas de modo a assegurar um acesso alargado ao seu mercado por companhias europeias, o que permitirá potenciar a promoção e o reforço das ligações e fluxos turísticos entre a Região e os Estados Unidos.

No que se refere aos serviços de transporte marítimo, entendemos que a dimensão e o impacto desta Parceria sobre os fluxos comerciais transatlânticos e mundiais não poderão ser dissociados da mais-valia que representa a localização privilegiada deste arquipélago e que encontra, aqui, enquadramento para a prestação de serviços associados à entrada e à saída de mercadorias no espaço europeu, conferindo uma nova centralidade aos Açores na interligação entre as duas margens do Atlântico.

E poderíamos, ainda, referir outros fatores ligados ao incremento do tráfego marítimo transatlântico, como a utilização de gás liquefeito para o abastecimento de navios (tema sobre o qual a Região trabalha já no âmbito do projeto COSTA) ou, ainda, que a maior autonomia energética dos Estados Unidos poderá libertar uma parte substancial dessa nova capacidade de produção de petróleo e de gás natural para o abastecimento da Europa Ocidental.

Em suma, entendemos ser inquestionável o papel que esta Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento pode ter para o incremento das trocas comerciais e para o reforço das relações políticas e institucionais entre a Região Autónoma dos Açores e os Estados Unidos da América.

O Governo dos Açores encara, por isso, esta futura Parceria como uma real oportunidade para os nossos empresários e para a Região, que têm aqui uma conjuntura favorável para aliar às relações históricas, culturais e institucionais com os Estados Unidos o reforço, efetivo e crescente, da componente comercial e de serviços.

Obrigado pela vossa atenção.


Anexos:
2014.08.01-SsRPRE-TransatlânticaUE-EUA.mp3

GaCS

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