terça-feira, 4 de setembro de 2012

Intervenção do Presidente do Governo


Texto integral da intervenção do Presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César, proferida hoje, na ALRAA, no âmbito da interpelação ao Governo promovida pelo Partido Socialista sobre o Protocolo de Entendimento e Cooperação entre o Governo dos Açores e o Governo da República:

"Muitos açorianos perguntam-me: temos uma crise nas finanças públicas regionais? A minha resposta é: não, não temos. O próximo governo não terá esse bloqueio.

Muitos dos que ainda não foram diretamente prejudicados, perguntam-me: já chegaram à Região os efeitos da crise económica? Das dificuldades de financiamento da banca? Das dificuldades para os empresários, para as empresas e para os empregos? Respondo-lhes: sim.

Tal como este governo, o próximo governo terá de trabalhar muito e inovar para minimizar esses aspetos negativos, embora, infelizmente, a maior parte dessas medidas não dependam do Governo Regional.

Não vivemos, no que toca às finanças públicas, numa situação de abundância ou muito menos de forma folgada. Se vivêssemos nessa abundância, estariam resolvidos muitos dos problemas dos nossos empresários e das nossas famílias, que têm de esperar por uma melhor resolução.

Mesmo assim, graças às disponibilidades financeiras que conseguimos preservar, temos conseguido muitos meios para apoiar a vida das nossas famílias e a atividade e capacidade empregadora das nossas empresas.

Justamente, o que o relatório da Inspeção Geral de Finanças, tal como o da Direção Geral do Orçamento, tal como as apreciações no âmbito da “troika” e de uma diversidade de organismos dizem, é que a nossa gestão tem sido positiva. A nossa dívida está contida, enquanto a do país está sempre a aumentar e até aumentou significativamente com o Governo da República atualmente em funções.

Na verdade, enquanto nós não contribuímos para a dívida e o aumento do défice no país, o governo de Lisboa, com as medidas que toma e que cá chegam, tem, ao invés, contribuído para o agravamento entre nós, nas nossas ilhas, da crise e do desemprego.

Só pessoas desesperadas, por os açorianos não lhes darem a atenção que queriam e que pediam, é que podem dizer a sério que a crise que nos chegou é culpa do Governo dos Açores.

Como já foi aqui caricaturado, para o PSD parece que, em todo o lado, tudo o que se passou é culpa do PS-Açores. Qualquer pessoa séria, séria!, sabe bem que a crise chegou à Europa por efeito da crise financeira nos Estados Unidos. Que chegou a Portugal no contexto geral da crise das dívidas soberanas. Que prossegue em Portugal enquanto não houver uma solução europeia. E que, evidentemente, se repercute nos Açores enquanto a crise não aliviar no continente, no país e na Europa de que dependemos e com os quais nos relacionamos.

Por que razão assinamos um acordo com o Governo da República? O memorando que acordamos com o Governo da República, anunciado em comunicado do Conselho do Governo e que levamos ao conhecimento do parlamento através da sua comissão especializada de Economia, teria de ser, em qualquer caso, celebrado. E teria de ser por duas circunstâncias aconselháveis: não só porque nesta fase era melhor enquadrar no modelo e no nível nacional o pagamento da dívida que os Açores tinham de fazer, como, por outro lado, era inadiável definir o papel e as obrigações dos Açores no âmbito da contratação feita por Portugal há pouco mais de um ano com a “troika”.

Porque escolhemos recorrer, tal como o Estado tem feito para si, à autorização de recursos financeiros decorrentes da emissão de obrigações de tesouro do Estado, para pagarmos agora a dívida vencida dos Açores e ficarmos até 2016 sem pagamentos a fazer? Por duas razões: primeiro, porque Portugal, e com ele e por causa dele, a generalidade das suas entidades públicas, incluindo as regiões autónomas, deixaram de ter acesso direto, em boas condições, aos mercados financeiros externos. E segundo, porque havendo embora a possibilidade de recorrer a alguma banca, este é o crédito atualmente disponível em melhores condições de taxas e de prazos.

O Estado, porém, não nos fez nenhum favor. Aliás, só nos prejudicou com o seu colapso. A Região Autónoma dos Açores limitou-se a escolher, e bem, a forma mais barata de ter dinheiro. Sem aumentar a sua dívida e sem aumentar um cêntimo o seu défice e a sua dívida, bem como a dívida ou o défice do país.

Há outra circunstância que exigia passar a papel este memorando. Que era a de saber o papel e a participação da Região no programa nacional de consolidação orçamental e financeira acordado com a “troika”. Era isso que era preciso aclarar e que exigia ao Primeiro-Ministro em julho de 2011. Sabemos, e temos sofrido com isso, que há medidas nacionais que nos atingem negativamente porque não há forma de as evitar e são competências próprias do Governo da República. Mas era preciso saber se, como aconteceu na Madeira, para cumprirmos os mesmo objetivos, iriamos ter o programa de austeridade nacional da “troika”, mais ainda outro programa de austeridade regional a somar. Ora, tal como nós queríamos e como conseguimos, por mérito próprio, passamos a ter, com o memorando agora assinado, menos e não mais medidas que as previstas no memorando da “troika” para a administração central. E, afinal, todas as medidas com que concordmos e de que falam neste memorando já tinham sido ou tomadas nos Açores ou já estão a ser aplicadas há tempo. É por isso que o relatório da Inspeção Geral de Finanças conclui, passo a citar: “analisando os vários riscos orçamentais, a situação financeira e orçamental da administração regional dos Açores não comporta riscos que impliquem apoios significativos”.

A este acordo, alguma oposição, em vésperas de eleições, respondeu, para citar o Primeiro-ministro, numa histeria. Nós, comprovadamente, respondemos que se trata, no contexto nacional, de uma vitória. Sim, de uma vitória dos Açores e de um reconhecimento da boa gestão financeira do Governo Regional do Partido Socialista.

Mesmo em aspetos mais sensíveis o memorando acordado é claro e insere-se no nosso entendimento. O memorando é claro em que benefícios sociais, como os complementos de pensão ou de abono de família para os açorianos, como a remuneração complementar ou a remuneração compensatória dos funcionários públicos – em que o PSD esteve contra – continuarão em vigor. Mas nós concordámos que novas medidas compensatórias na função pública não devem ser tomadas para não afetar o equilíbrio sensível existente. O memorando replica o que o memorando da “troika” já obriga todo o país e já nos obrigava, nos Açores, a não fazer mais parcerias público-privadas. Ora, todos nós sabemos que não íamos fazer mais parceiras público-privadas.

O memorando isenta os Açores da diminuição de 2% do número de funcionários públicos, como era determinado no memorando da “troika”, apenas referindo o esforço em curso de diminuir o número de funcionários públicos ou o peso empregador da função pública. Ou seja, é mentira que exista qualquer perspetiva de despedimentos na função pública. Ou seja, basta admitir menos funcionários públicos do que aqueles que vão para a aposentação para diminuir o número de funcionários públicos na nossa região.

O memorando lembra-nos a obrigação, que é agora europeia, de cumprir os objetivos de equilíbrio financeiro, mas deixa claramente ao nosso critério a natureza ou a intensidade das medidas aconselháveis para esse efeito.

O memorando não afeta a nossa política fiscal própria e a própria Lei de Finanças Regionais, cuja revisão se deverá confinar aos acertos com a nova lei de enquadramento orçamental e até com a introdução de normas mais favoráveis aos Açores, quer quanto ao endividamento, quer quanto a regras de equivalência orçamental.

Mas, afinal, em que é que o memorando afeta a nossa Autonomia? Em nos obrigarmos a enviar para apreciação técnica documentos prisionais da despesa, como o plano anual ou orçamento, antes de serem submetidos à Assembleia? Claro que não. Mas é assim que estamos todos na Europa, a fazer a integração financeira e orçamental. Essa é a prática de reporte financeiro recíproco que já vigora e que é mesmo metodologicamente natural e indispensável. Toda a gente faz isso a toda a gente, em termos orçamentais e financeiros. É assim que devemos fazer, aliás, de acordo com a Lei de Finanças Regionais que está em vigor há anos. Como se pode o país comprometer em atingir um determinado nível de défice se não souber antecipadamente o défice previsto, por exemplo, das administrações regionais?

O exercício da nossa autonomia já é assim, não só no país, como na Europa. Neste, como em outros aspetos, até para decisões, como bem sabemos, por exemplo, para baixar as tarifas aéreas.

Só o desconhecimento total da função governativa no espaço em que vivemos, ou a mais primária das demagogias, é que pode levar, mesmo em vésperas de eleições, a contestar que não só tem que ser assim como há muito que é assim.

De resto, a região só está obrigada a assegurar uma situação orçamental próxima do equilíbrio. Todos na Europa estão obrigados, atualmente, a isso. Ora, da apreciação técnica dos nossos documentos previsionais até podem resultar divergências, mas a verdade é que, havendo esse equilíbrio, o parlamento e a região poderão na mesma aprovar esse Plano e esse Orçamento. E, portanto, não está em causa um poder que é do parlamento, que é da região e que usaremos como melhor entendermos para atingir os objetivos gerais.

Não há perda de Autonomia com este memorando. Perda de Autonomia houve, sim, para o país e para todos nós quando o país ficou nas mãos do Fundo Monetário Internacional e da “troika”. Perda de Autonomia do país e da região certamente haverá quando a Europa fizer a única coisa que pode fazer para se salvar e que andamos todos a reclamar: unir-se e passar a ter um governo eleito, uma governação económica, uma governação financeira, uma governação fiscal, uma governação monetária, um estado social padrão e uma entidade de defesa e segurança comuns. Aí, sim, todos dependeremos mais uns dos outros, mas todos e cada um de nós seremos mais fortes.

Senhor Presidente, senhoras e senhores deputados, o relatório da Inspeção Geral de Finanças demonstra, como referem todos os analistas e órgãos de comunicação social independentes, dentro e fora da região, o bom desempenho relativo dos Açores.

Quanto aos chamados riscos conjunturais, o risco apontado pela IGF dos empréstimos vencidos já foi ultrapassado, e bem. O risco, segundo a IGF, dos avales concedidos, ou seja, do sector público cumprir as suas prestações, existe, é claro, por definição. Mas a verdade é que nunca aconteceu e pesem embora as situações dos hospitais, a Saudaçor, por exemplo, só terá encargos significativos a cumprir em 2020.

Aliás, neste sector, que tenho chamado de o nosso “calcanhar de Aquiles”, o risco da dívida de curto prazo na saúde a fornecedores desapareceria, num instante, se o Governo da República nos pagasse o que os subsistemas devem aos hospitais e centros de saúde da região.

O risco a que a IGF alude, de dívida ao Serviço Nacional de Saúde, também já foi aqui explicado neste Parlamento e sê-lo-á, com certeza, em nova oportunidade. O risco das PPP’s resume-se, afinal, à possibilidade de, por via da alteração do trânsito previsto, haver uma alteração dos pagamentos a efetuar. Nenhum outro risco é referido pela Inspeção Geral de Finanças e, por isso, a própria Inspeção Geral de Finanças concluiu que a situação dos Açores não comporta riscos significativos.

Senhoras e senhores deputados, em verdade e em conclusão:

Primeiro: o relatório da Inspeção Geral de Finanças exclui um risco financeiro ou orçamental significativo nos Açores que requeira apoios.

Segundo: o relatório da Direção Geral do Orçamento aclara que o risco de derrapagem não existe, pois apesar da quebra da receita fiscal, em resultado das medidas do Governo da República, o Governo Regional tem ajustado a sua despesa e vai ter receitas de fundos comunitários em montante superior ao previsto.

Terceiro: o memorando de entendimento Lisboa/Açores resolveu compromissos da Região até 2016, libertando os futuros governos, e esclareceu, preto no branco, que nos Açores não são necessárias as medidas que o Governo da República tem, impostas para a administração central pela “troika”, e muito menos as da Madeira.

Nos Açores não se perde qualquer das competências autonómicas e constitucionais. A conclusão é incontornável, por mais que custe à oposição e, em particular, ao PSD. Isso foi e é assim porque a nossa situação financeira é melhor e porque o Governo dos Açores governou e governa melhor que os governos da Madeira e os governos do país.

Muito obrigado."



GaCS

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