domingo, 29 de abril de 2012

Intervenção do Secretário Regional da Presidência


Texto integral da intervenção do Secretário Regional da Presidência, André Bradford, proferida hoje, na Horta, na Sessão de Encerramento do III Fórum Açoriano Franklin D. Roosevelt: o mar na perspetiva da história, da geostratégia e da ciência:


"Chegados ao fim da terceira edição do Fórum Açoriano Franklin Delano Roosevelt, cumpre-me, antes de mais e em nome do Governo dos Açores - enquanto co-autor e co-organizador desta iniciativa - destacar a riqueza das comunicações e dos debates ocorridos durantes estes três dias e sublinhar o espírito de discussão franca e aberta, de multidisciplinariedade, de partilha de ideias e de busca de novos rumos para a parceria bilateral entre Portugal e os Estados Unidos, que é já característico destes encontros.

É naturalmente altura, também, para o Governo dos Açores se associar formalmente aos agradecimentos devidos nesta ocasião e cumprimentar em particular a Câmara Municipal da Horta, pelo seu contributo essencial enquanto anfitriã, e a Fundação Luso Americana para o Desenvolvimento, na pessoa do seu administrador, Dr. Mário Mesquita, mentor e motor indispensável para a consolidação e sucesso desta ideia.
As restrições orçamentais a que esta iniciativa esteve sujeita, e que decorrem das adversidades financeiras dos dias que correm, foram amplamente suplantadas pelo compromisso das entidades envolvidas em não comprometer de forma alguma a valia dos debates, contando para tal, também, com o contributo desinteressado e absolutamente empenhado dos melhores especialistas regionais, nacionais e internacionais na matéria, a quem aproveito igualmente para agradecer.
Honrámos, assim, a tradição das anteriores edições e permitimos, uma vez mais, que este evento se destaque pela sua genuína natureza de fórum de debate aprofundado sobre as matérias que, a cada momento, estão na agenda do relacionamento transatlântico, sempre sob a égide da ação inspiradora de Roosevelt, quer enquanto revitalizador do Estado, entendido como agente e garante do interesse geral – e que falta nos faz o exemplo! -, quer na sua qualidade de promotor do relacionamento transatlântico.
Este ano, ocupamo-nos especificamente de áreas temáticas que, como ficou evidenciado nestes últimos dias, merecerão um lugar cada vez mais central no palco deste relacionamento – o Mar e a Ciência.
Fomos, para isso, inspirados pela cidade que nos acolheu e pelo seu papel de pivô nas relações entre o velho continente e as américas ao longo dos tempos, com particular enfâse para os períodos de conflito militar à escala mundial e para a época em que a navegação aérea transatlântica se começava a consolidar.
No caso vertente, a Horta é também sede do departamento da Universidade dos Açores especificamente dedicado à área da Oceanografia e um dos que mais está imbuído do espírito de cooperação internacional, o mesmo que, embora noutra época, com outros propósitos e com outra amplitude, Roosevelt ajudou a fundar e do qual foi um dos principais inspiradores.
De resto, e se atentarmos ao texto da Carta do Atlântico, de 10 de Agosto de 1941, estava já claramente definida também a natureza marítima da paz que Roosevelt e Churchill procuravam fundar e que definiam como sendo, e cito, “uma paz que deve permitir que todos os homens possam atravessar os mares e oceanos sem obstáculos”.
Roosevelt foi, dos três grandes líderes que desenharam o concerto das nações pós 45, aquele que mais claramente viu a cooperação global como essencial e, na verdade, o único caminho prático a seguir rumo à edificação da Paz. E no centro desse edifício institucional estavam as grandes nações e um direito de primazia configurado no poder de veto no âmbito do Conselho de Segurança, é certo, mas estavam também as Nações Unidas, enquanto grande assembleia de todas as nações, onde as matérias que a todos dizem respeito pudessem ser debatidas e os consensos se pudessem formar.
Não será surpreendente que o Mar, e em particular o Direito Internacional do Mar – a par das questões mais latas sobre Ambiente e sobre Desenvolvimento Sustentável, – seja uma das áreas onde o sucesso das Nações Unidas – ainda que sempre relativo, porque moroso e processualmente pesado – se faça sentir de forma mais evidente ou seja melhor percecionado pela opinião pública.
Ainda que, nas matérias da paz e da guerra, a ONU tenha registado, ao longo das décadas da Guerra Fria, um imobilismo total, fruto da confrontação direta entre as duas potências dominantes e das suas estratégias de alianças, e, mesmo depois disso, não tenha estado à altura das exigências em diferentes conflitos mundiais – no que concerne à regulação internacional do direito do Mar, as Nações Unidas, através da Convenção de Montego Bay, ajudaram a fundar uma das áreas mais inovadoras e complexas do Direito Internacional Público, com princípios totalmente originais e um número amplo de áreas temáticas.
É esse património de cooperação política, institucional e legislativa, assente num verdadeiro espírito de cooperação internacional, que permite hoje aos Açores almejarem uma nova relevância geoestratégica própria, um novo contributo para o posicionamento de Portugal no Atlântico, bem como o desenvolvimento de esforços para potenciar novas áreas de desenvolvimento económico com o devido benefício para todos os Açorianos.
Neste contexto, a extensão da plataforma continental portuguesa e a forma como, no futuro, os imensos recursos da nossa Zona Económica Exclusiva e da plataforma continental adjacente serão explorados, representa para esta Região, para o país e para a Europa uma enorme oportunidade.
É sobretudo com os Açores e por causa dos Açores que hoje Portugal regressa à sua vocação marítima.
É sobretudo com os Açores e por causa dos Açores que Portugal pode hoje voltar a sair da península e abrir os caminhos do mar à Europa.
A plena e permanente reivindicação da dimensão marítima da nossa Região e do papel ímpar e decisivo que ela desempenha na projeção geopolítica de Portugal, tem de ser por todos entendida como uma possibilidade de alavancagem do país, e particularmente agora, quando a intervenção dos órgãos de governo próprio no mar sofreu uma alteração importante com a última revisão constitucional e com a subsequente revisão estatutária.
É por isto que o tema é merecedor de iniciativa e dedicação por parte do Governo Regional, sendo não só uma das áreas mais desenvolvidas do programa do Governo, como também uma das que mais avançada e inovadora legislação tem vindo a gerar.
Os Açores são essencialmente mar, são intrinsecamente mar.

Há um lado poético e afetivo nessa constatação, mas também há uma convicção muito fundada e realista de que o mar é uma vocação e um potencial que exige toda a atenção dos poderes públicos em nome do interesse geral e do futuro sustentado desta Região.

É também por isso que a Política do Mar tem vindo a representar igualmente um eixo fundamental, determinante e prioritário da nossa relação com a União Europeia.

Após o lançamento em 2006, aqui mesmo na cidade da Horta, pelo Presidente da Comissão Europeia, do Livro Verde da Política Marítima Europeia, momento fundador de uma nova abordagem comunitária sobre as questões do mar, a Comissão apresentou mais recentemente a Comunicação intitulada “Desenvolver uma estratégia marítima para a Região Atlântica”, que dá o merecido destaque a esta importante área marítima no contexto europeu.

Um dos objetivos daquela que é habitualmente designada por “Estratégia do Atlântico” é, como é sabido, a adoção de um plano de ação até ao final de 2013, indicando medidas e projetos específicos merecedores de apoio e investimento. Neste processo de seleção o “Fórum do Atlântico” reveste-se de uma importância fundamental, uma vez que é um espaço de reflexão destinado a permitir aos Estados-Membros, ao Parlamento Europeu, às autoridades regionais, à sociedade civil e aos representantes de indústrias existentes e emergentes apresentarem os seus contributos.

Ciente da importância em trazer um evento desta relevância, uma vez mais, para os Açores, o Governo Regional cedo iniciou os contactos com o Governo da República e com a Comissão Europeia, manifestando a sua disponibilidade e todo o empenho em realizar o Seminário Português da Fórum do Atlântico nos Açores, intenção esta que mereceu o melhor acolhimento dos responsáveis nacionais e europeus.

É por isso, com muito agrado que posso anunciar que, em Setembro próximo, se realizará aqui, nesta cidade mar, o Fórum do Atlântico, sob o tema "Coastal and Deep Natural Resources", um momento de reflexão, mas também de determinação do futuro, que reunirá altos responsáveis de instituições europeias, de Estados Membros, Regiões, instituições de investigação, de sectores económicos ligados à área e da sociedade civil, e colocará uma vez mais os Açores, não apenas no centro do Atlântico, mas também no centro das discussões europeias sobre Política Marítima.

A cooperação transatlântica, como qualquer relação de parceria, envolve uma componente conjuntural e dinâmica, redesenhando-se em função da envolvente estratégica, revigorando-se ou debilitando-se em detrimento de outros interesses e outras prioridades mais ou menos circunstanciais – não falta, por exemplo, quem hoje diga que “o Pacífico é o novo Atlântico” e que, por isso, a cooperação euro-americana sofrerá em intensidade.
Contudo, nós fazemos questão de continuar a acreditar na vertente estrutural de uma relação que é também de amizade historicamente fundada no reconhecimento do novo mundo e fortificada ao longo dos séculos, de uma amizade que se tem sabido sempre renovar em prol dos interesses comuns e que, apesar das contingências próprias da vida interna de cada um dos Estados parceiros, tem implicado sempre uma consideração especial, que tem ido para além da concretização imediata de objetivos quantitativos.
Os Açores, em particular através da presença de um contingente militar americano na ilha Terceira, têm dado um contributo muito concreto e significativo para que os valores e princípios que comungamos mereçam a mais ampla consagração.
Neste tipo de relacionamento, o que se espera das partes é que sejam capazes de, em nome da perenidade das convicções e do histórico de cooperação que partilham, encontrar sempre as soluções que melhor acomodam as aspirações e os interesses em jogo.
É por isso que os Açores aguardam, ativamente, que a razão diplomática tenha pelo menos tanto peso quanto os imperativos financeiros e os ditames militares, de modo a garantir que a parceria atlântica centrada na Região não se converta numa relação residual, em que a memória se sobreponha ao futuro e em que o papel de interlocutor privilegiado para o Atlântico, que Portugal tem vindo a assumir por direito próprio, possa ser atribuído a outros com menor vocação e muito menor tradição de cooperação.
Gostaria de terminar agradecendo a todos o enorme contributo que deram a mais uma bem-sucedida reunião do Fórum Roosevelt e reiterando junto da FLAD a determinação do Governo dos Açores em avançarmos conjuntamente, a partir de amanhã se necessário, para a quarta edição, porque é cada vez maior convicção de que momentos de reflexão habilitada e consequente como aquela que se gera de cada vez que nos reunimos são essenciais à prática governativa e à definição do futuro que almejamos".
GaCS

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