
Texto integral da intervenção do Secretário Regional da Presidência, André Bradford, proferida hoje, em Angra do Heroísmo, na sessão de encerramento II Fórum Açoriano Franklin D. Roosevelt:
“Após três dias de intensa actividade e de profunda reflexão em torno do legado de Franklin Roosevelt e do papel do eixo transatlântico - e dos Açores em particular - no redesenho emergente do xadrez internacional, julgo que podemos afirmar, com toda a convicção e certeza, que o Fórum Açoriano Franklin Roosevelt é um projecto consolidado e que esta segunda edição constituiu uma demonstração clara de que as premissas que justificaram inicialmente este evento podem sempre ser reinventadas e actualizadas sem que se perca a valia da sua intenção original.
Mudámos de cenário, mudámos o enfoque temático, alargámos o leque de intervenientes, em termos geográficos e de especialização académica, e o Fórum viu reforçadas as suas virtualidades enquanto instrumento de projecção do préstimo geoestratégico dos Açores e de contributo expressivo para uma reflexão aprofundada sobre o estado do relacionamento euro-americano, o que adquire ainda maior relevo numa altura em que comemoramos o facto de sermos a Região Europeia do Ano de 2010.
Cumpre, pois, ao Governo Regional, nesta circunstância e na qualidade de parceiro convicto desta iniciativa, destacar o empenho e a dedicação da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD) na concretização deste evento e agradecer a disponibilidade renovada da Biblioteca Presidencial Franklin Roosevelt, aqui representada pela sua directora, que, desde a primeira hora, reconheceu o sentido da ligação desta região ao legado doutrinal do Presidente Roosevelt em matéria de relações externas.
Embora ainda não tenhamos tido oportunidade para nos preocuparmos com a terceira edição do Fórum, estou certo de que sentimos todos ser nossa obrigação dar continuidade a esta parceria, que constitui decididamente uma das marcas mais perenes da colaboração que se deseja entre a Região Autónoma dos Açores e a FLAD, entidade que, deste modo, cumpre, não só a incumbência estatutária de promover a cooperação de cariz científico e educacional entre Portugal e os Estados Unidos, como o faz através da parcela de território português que mais directamente justifica a sua própria matriz fundacional.
Se ainda não foi tempo de os Açores justificarem uma linha específica de apoio no âmbito da orçamentação dos projectos anuais da FLAD, foi pelo menos ocasião de sentirmos com maior proximidade a sua acção, e isso deve ser reconhecido.
Permitam-me, neste âmbito, que saliente também o particular simbolismo de termos realizado esta segunda edição do Fórum na Terceira, ilha que Roosevelt não chegou a visitar mas que é o cenário de concretização plena do papel estratégico que o estadista reconhecia aos Açores – o de posto avançado no Atlântico de defesa dos interesses americanos e de sede figurativa do espírito transatlântico de cooperação.
No capítulo dos agradecimentos, é igualmente devida uma menção específica ao facto do Fórum Açoriano Franklin Roosevelt se realizar no quadro da cooperação bilateral entre Portugal e os Estados Unidos, e de beneficiar de apoio do Programa de Iniciativas de Cooperação Específica com os Açores, que funciona nesse âmbito.
Creio que, em hora de balanço dos nossos trabalhos, se pode dizer com propriedade que terminamos esta segunda edição com uma sensação de saudável desconforto intelectual. Tal como dizia Roosevelt, “não sendo a pessoa mais inteligente do mundo, sei rodear-me de pessoas inteligentes”, e isso tem necessariamente consequências positivas.
Raro foi o tema ou a dimensão de análise que suscitou consenso inequívoco; raro foi o painel que, partindo de abordagens pessoais e/ou sectoriais, chegou a uma síntese absolutamente generalizável a todos os seus intervenientes; rara foi também a palestra limitada à resenha segura do pensamento dominante.
Esta é - permitam-me a imodéstia - a melhor prova do sucesso deste fórum, que se constitui mais como um instigador de diálogos do que como um promotor de consensos, e que valoriza mais o debate livre e plural de pontos de vista do que o conformismo inerente aos ambientes intelectualmente assépticos.
Se para uns a vitalidade e a valia estratégica do papel dos Açores no quadro actual das relações transatlânticas é indubitável, para outros tal só será possível através de uma renovação funcional da presença norte-americana nas Lajes; se para muitos começa a não fazer sentido hoje pensar-se a cooperação entre Portugal e os Estados Unidos apenas, ou predominantemente, no plano da Defesa e Segurança, para outros tantos a razão essencial desta ligação secular será sempre mais forte do que eventuais imperativos conjunturais de ordem sectorial.
Se houve quem considerasse que a intensificação da experiência europeia de Portugal teria tido um reflexo inverso na intensidade da cooperação luso-americana, houve também quem optasse por considerar que a vocação atlântica de Portugal será sempre melhor aproveitada se for promovido um equilíbrio estável entre as nossas duas grandes fronteiras de cooperação.
Sendo verdade, pois, que tivemos interpretações e opiniões diversas, também não é menos verdade, do nosso ponto de vista, que se vislumbraram algumas grandes tendências de análise, que importa nesta ocasião vincar.
Desde logo, o peso crescente da dimensão científica e tecnológica no relacionamento transatlântico e a sua importância na redefinição dos interesses e do conceito de cooperação estratégica. Julgo mesmo que podemos afirmar com segurança que, seja por via das energias renováveis, seja por causa das preocupações com as questões climáticas, seja ainda por intermédio da valorização crescente da investigação marinha, o Atlântico tende a ser cada vez mais um espaço de cooperação científica e isso valoriza o papel central dos Açores e das suas características enquanto observatório natural e entreposto estratégico.
Por outro lado, as nossas reflexões demonstraram de forma genericamente evidente que, devido à necessidade de novos equilíbrios entre potências tradicionais e potências emergentes, o mundo clama por um rearranjo organizacional e o espaço atlântico de cooperação busca um novo conceito estratégico, que terá não só de definir as linhas directrizes da sua configuração a Leste, como terá necessariamente de garantir uma articulação eficiente a Sul, juntando o poderio crescente do Brasil à estabilização cada vez mais premente do continente africano.
Reconhecem-se, a este propósito, as especiais obrigações de Portugal, enquanto país historicamente responsável pela comunhão do Atlântico e anfitrião da próxima cimeira da NATO, ocasião soberana para que seja dado um impulso decisivo a este processo.
Creio também ter sido relativamente consensual a noção de que a emergência e consolidação de outros palcos de interacção entre os principais blocos internacionais terá forçosamente impacto sobre o grau de consideração com que os diversos actores, mas principalmente os Estados Unidos, encararão os desafios da cooperação euro-atlântica.
Na qualidade de representante do Governo Regional dos Açores nesta sessão de encerramento, permitam-me a ousadia de salientar também o facto de, em qualquer dos cenários desenhados para o futuro do relacionamento entre as duas margens do Atlântico, a geografia – aliada à Defesa, ou à Política, ou à Ciência, para o caso é relativamente indiferente – permanecer sempre como uma marca incontornável do papel e da importância dos Açores.
Ainda há poucos dias, Portugal apresentou à Comissão de Limites da Plataforma Continental das Nações Unidas os fundamentos jurídicos, científicos e técnicos da candidatura nacional à extensão da sua plataforma continental para além das 200 milhas náuticas, procurando desta forma potenciar o aproveitamento das características geológicas e hidrográficas dos fundos marinhos, mas também alargar a sua dimensão enquanto média potência atlântica.
Este objectivo é especialmente baseado no espaço geográfico que a candidatura define como a Região Ocidental do território português e que compreende a Zona Económica Exclusiva dos Açores.
Além de se comprovar mais uma vez que a profundidade atlântica do nosso país está intimamente relacionada com a geografia destas ilhas, reitera-se, por esta via, a noção de que o peso de Portugal enquanto parceiro atlântico será tanto mais valorizado externamente quanto o nosso país for capaz de valorizar as potencialidades estratégicas dos Açores.
É a própria Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental que afirma, ao justificar a relevância do projecto, e cito, que “a importância desta candidatura deriva, em boa medida, da projecção internacional e da maior visibilidade que confere a Portugal”, permitindo uma afirmação estratégica relevante, assente num maior território e num maior controlo marítimo”.
Diz-se ainda que, e volto a citar, esta missão “significa o reforço inequívoco da posição de Portugal em matérias relativas ao mar e aos oceanos, permitindo ao nosso país assumir-se, cada vez mais, como uma importante nação marítima europeia”.
A par do imperativo de renovação permanente da funcionalidade da presença americana nos Açores, razão de ser fundamental da capacidade de interlocução de Portugal no contexto atlântico, abre-se agora uma nova via de valorização do potencial geoestratégico da nossa Região, em linha com as tendências contemporâneas de reforço da componente científica como área privilegiada de cooperação.
O Governo dos Açores, reconhecendo a importância e as virtualidades do esforço desenvolvido e assumindo o seu dever de representação dos interesses dos Açorianos, está obviamente disponível e empenhado na procura de formas conjuntas de aproveitamento do potencial que agora se abre, quer quanto às consequências científicas, quer quanto aos impactes sócio-económicos, quer ainda no que à protecção da biodiversidade e valorização do património marinho diz respeito.
Entre muitas outras expressões de sapiência e de estatura moral, FDR avisou-nos que a verdade só é encontrada quando os homens são livres para a procurarem.
Considero ter sido sempre este o espírito desta iniciativa, patente nas suas duas primeiras edições, e desejo que continue a ser este o mote para a terceira edição do Fórum Açoriano Franklin D. Roosevelt, que merecerá do Governo Regional o mesmo compromisso e o mesmo empenho.
“Para alcançar um porto temos de velejar. Velejar não ancorar, velejar não flutuar. Velejar!”, disse Roosevelt. Velejemos, pois, até 2012.
Muito obrigado pela vossa atenção.”
GaCS/LFC







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