terça-feira, 5 de outubro de 2010

Intervenção do Presidente do Governo na inauguração da Escola de Vila Franca do Campo



Texto integral da intervenção do Presidente do Governo, Carlos César, proferida hoje, em Vila Franca do Campo, na cerimónia de inauguração da Escola Básica e Secundária:

“Inauguramos, hoje, esta Escola Básica e Secundária de Vila Franca do Campo, associando este acto público à revolução de 5 de Outubro e à comemoração do centenário da implantação da República.

Saúdo, nesta circunstância, a Senhora Ministra da Cultura e nossa conterrânea Gabriela Canavilhas, agradecendo-lhe ter aceitado o nosso convite para partilhar connosco mais este momento realizador. A sua presença faz notar, com o maior brilho, o trabalho que se desenvolve nos Açores e que muito contribui para um Portugal globalmente mais democrático e mais capacitado. A sua acção no Governo da República, sobretudo nestes tempos actuais mais difíceis, muito tem ajudado a conservar a alma e a realizar a utopia no confronto com a opressão orçamentária. Temos, assim, especial gosto em vê-la associada à obra que realizamos e à qual tem emprestado o seu mérito por diversas formas e em diferentes ocasiões.

A significação maior da inauguração de uma escola pública neste dia assenta, justamente, na sua ênfase e afinidade com a gesta republicana que desde logo associou a liberdade e a cidadania à capacitação dos portugueses.

Aspirações, é certo, do povo disperso e anónimo – que outorgou energia e paixão revolucionárias – mas que também tiveram, na formatação do seu ideário e nas suas diligências de concretização mais qualificadas, gente açoriana esclarecida e determinante. Como pouco mais parece necessário para o ilustrar – e para além dos muitos que por todas estas nossas ilhas porfiaram, persuadiram e realizaram – evocamos os nomes insignes de Teófilo Braga e de Manuel de Arriaga, que ocuparam os lugares cimeiros de Presidente da República, e também de chefe do Governo Provisório no caso de Teófilo Braga.

Com o seu pensamento e a sua acção, estes dois estadistas marcaram a história política e contemporânea portuguesa. De tal forma o fizeram que podemos afirmar que a formação do ideário republicano português tem a marca genética açoriana, do mesmo modo que o ideário socialista a teve através de Antero de Quental. A herança recebida destes homens só pode impressionar positivamente a nossa acção, porque a matriz dos valores que defenderam é uma matriz universal.

A liberdade é um princípio basilar das sociedades contemporâneas, cuja conquista tem acarretado enormes sacrifícios à humanidade. Durante a I República incubaram-se condições para que o cidadão se pudesse exprimir livremente, através da palavra e da escrita, e se pudesse associar, reunir ou manifestar. Com este sentido, a liberdade de expressão, sem censura prévia, foi um valor que ficou desde logo plasmado na Constituição de 1911.

Liberdade e cidadania, dois princípios dilectos do pensamento republicano, encontraram, por exemplo, em Teófilo Braga, um diligente defensor quando perspectivou que a revolução republicana seria “o chamamento geral do povo a uma intervenção imediata, eficaz, constante, na direcção dos seus destinos.” Havia, porém, um pleno entendimento de que o exercício dessa liberdade e dessa impulsão cívica seria tanto mais consciente e tanto mais incitador quanto maior fosse o nível de instrução dos cidadãos.

Como corolário, decorre o enorme empenho dos republicanos no combate ao analfabetismo, tendo o Governo Provisório republicano criado, num só ano, cerca de mil escolas primárias. A formação de professores foi outra das componentes dessa reforma do ensino, que então se tornou laico. De resto, ao longo do período em que vigorou a I República, muitas outras medidas foram tomadas que alteraram profundamente a estrutura do ensino, desde o nível primário até ao ensino superior. O ensino de adultos ganhou uma nova dimensão, com o crescimento das escolas móveis, num esforço conjunto para levar a instrução aos mais recônditos lugares do país. No acervo da I República, a Educação para a Cidadania constitui, pois, um provento indiscutível para os homens, tal como para as mulheres.

Aliás, a emancipação da mulher foi outra frente de batalha encetada por alguns republicanos mais progressistas contra aqueles, que ainda perduraram, que mantinham visões retrógradas e ainda se opunham à simples aquisição de direitos semelhantes aos do homem. Neste confronto de ideias, destacaram-se algumas mulheres que, pela sua craveira intelectual e pela lucidez das suas propostas, continuaram a servir de modelo às lutas que se desenvolveram posteriormente, sobressaindo nos Açores mulheres ligadas a estes ideais, tal como pelo seu empenho em prol da educação, como, por exemplo, Alice Moderno e Maria Evelina de Sousa.

Alice Moderno foi professora, escritora, jornalista, mulher de negócios e benemérita. Maria Evelina de Sousa desenvolveu uma notória intervenção pública e cultural, nomeadamente através da imprensa; foi professora e jornalista, dirigindo a Revista Pedagógica, órgão do professorado açoriano; ainda no tempo da Monarquia, foi defensora da laicização do ensino. As duas estiveram ligadas à Associação de Propaganda Feminista e à Liga Republicana das Mulheres Portuguesas e conseguiram fazer valer muitos dos seus pontos de vista na sociedade micaelense, onde viviam e enfrentaram as adversidades próprias (e impróprias!...) do seu meio conservador. O direito ao voto da mulher ficaria, porém, para mais tarde: a mentalidade da época não era tão ousada para franquear as portas a domínios que, até então, pertenciam ao sexo masculino, mas toda essa luta e todo esse debate deixaram sementes que frutificaram mais tarde, como bem sabemos.

Esta cerimónia de inauguração das novas instalações da Escola Básica e Secundária de Vila Franca do Campo insere-se, pois, na mesma decorrência de preocupações de criação das melhores condições para a actividade educativa.

A Educação continua a ser uma aposta decisiva nos Açores actuais e, de forma mais intensa, nesta última década. Só nesta Legislatura, entre 2008 e 2012, prevemos concretizar um investimento em construções escolares superior a cento e quarenta milhões de euros, quer na grande reparação e ampliação de instalações já existentes, quer na construção de raiz de novos edifícios, todos eles equipados e dotados das condições apropriadas à prática de um ensino de qualidade e à adequada cobertura do território nos diversos graus de ensino.

A remodelação e ampliação desta escola, que agora simbolicamente se assinala, no valor de 12 milhões de euros, implicaram a demolição de áreas já existentes e a construção de dois novos edifícios: um destinado ao 2º e 3º ciclos e outro para o ensino secundário, com uma capacidade total para cerca de mil alunos. Os novos espaços escolares compreendem vinte salas de aula, laboratórios, auditório, salas de ensino específico, refeitório, pavilhão desportivo e áreas exteriores. Uma parte destas funcionalidades, como são os casos do auditório e das infra-estruturas desportivas, fica igualmente ao dispor da comunidade local, reforçando-se, desse modo, a disponibilidade de equipamentos colectivos e a interacção da escola com o meio social envolvente.

O concelho de Vila Franca ganha outra qualidade em termos de estruturas educativas. Para além desta escola, o concelho ficará, ainda neste ano lectivo, com mais uma nova infra-estrutura – a Escola Básica e Integrada de Ponta Garça – igualmente dotada de modernos espaços e equipamentos. Também no que concerne ao parque escolar do 1º ciclo deste concelho perspectiva-se, a curto prazo e com o apoio do Governo, a sua requalificação, e a construção de novas instalações para a Escola Profissional de Vila Franca é outro dos investimentos para o qual o Governo já reservou os fundos necessários. Assumimos, assim, compromissos da maior importância para a qualificação e a dignificação dos vilafranquenses e dos açorianos em geral. Fico satisfeito por estarmos a consegui-lo.

A aposta na educação tem sido uma constante nos Açores e, quer no que concerne ao programa de construções escolares, quer nos investimentos em equipamentos e recursos tecnológicos, contamos, apesar dos actuais constrangimentos de financiamento externo, prosseguir a sua execução com a intensidade projectada.

As exigências do mundo actual levam a que não possamos ficar para trás no que diz respeito à educação, principalmente quando se aceita que o conhecimento e a capacidade de se aprender ao longo da vida são pilares fundamentais da sustentabilidade e do progresso social.

Ainda este ano lectivo, iniciamos outros projectos pedagógicos importantes para todo o sistema educativo e para a sociedade açoriana, como a Educação para o Empreendedorismo, a Educação para a Saúde e o Plano Regional de Leitura. Continuamos a apostar fortemente na oferta de vários percursos formativos e, por isso, temos soluções próprias a nível regional, como os cursos do PROFIJ, o Programa Oportunidade, o ensino recorrente, o ensino mediatizado e o Programa Reactivar. Com estes diferentes itinerários no sistema educativo esperamos contribuir para a melhoria e o prosseguimento da escolaridade, seja na via do secundário regular, do ensino superior, ou do acesso a cursos que conferem qualificação profissional.

Temos muito ainda a fazer para melhorarmos esta progressão, mesmo em alguns aspectos, como no combate ao abandono escolar, em que a nossa tarefa tem sido bem sucedida, uma vez que a taxa de alunos que deixam o sistema educativo obrigatório antes do tempo é já residual. São tarefas intransmissíveis, é certo, da escola pública, mas também das famílias, as quais devem reconhecer o valor da escola e da formação para o futuro pessoal e profissional especialmente dos seus jovens.

Se a comemoração do primeiro centenário da República tem por objectivo unir os cidadãos em torno de símbolos e de valores susceptíveis de contribuir para a unidade e a coesão nacionais, bem como para o aperfeiçoamento da humanidade, devemos então, todos, tudo fazer para aprestarmos as novas gerações no caminho da fraternidade progressista. São esses os conteúdos mais relevantes de investimentos como o que estamos neste preciso momento a celebrar.

Parabéns a Vila Franca do Campo e parabéns à República."


GaCS/CT

Sem comentários: